O ORGULHO E O ROCHEDO QUE CHORA
Rangel Alves da Costa*
Segundo a mitologia grega, Níobe era uma lendária rainha frígia que personificava o orgulho, a soberbia, o amor-próprio em demasia. Pelo seu poder, riqueza e admiração de seus súditos, achava-se destemida e imortal. Por ser assim, cheia de presunção e de arrogância, desafiava a autoridade dos outros deuses e os desconsiderava, ultrapassando as medidas comportamentais de respeito que as divindades deveriam manter entre si.
Outro mito, contudo, diz que o orgulho demasiado de Níobe devia-se ao fato dela ter fecundado sete filhas e sete filhos, fato que a fazia escarnecer de outras mães que possuíam prole pequena. Para se vingar da mãe orgulhosa, que tratava as demais com zombaria, desprezo e desdém, mataram todos os seus quatorze filhos. De angústia e tristeza, Níobe se transformou num rochedo que chorava.
O mito de Níobe, como todos os demais mitos gregos, objetiva explicar determinada realidade, cuidando de problemas existenciais, morais e sociais que afligiam os deuses e continuam afligindo a humanidade. Neste caso específico, o que o mito evidencia é que o orgulho poderá ser castigado com lágrimas eternas naquele que vê o outro com insignificância, pequenez ou simplesmente como algo que não merece nenhuma atenção.
Tal qual o mito, a realidade presente tem por base a busca de explicações para tudo que acontece. Procurando nas raízes das coisas é que são encontradas as respostas para as condutas, as virtudes, a moral, a ética, o respeito, os comportamentos, os desvios, enfim, para tudo que caracteriza as situações da vida. Níobe era orgulhosa e pagou caro por isso, e quantas pessoas que estão ao nosso redor com ares de majestade, de preconceito e discriminação, de hipocrisia, de demagogia, de egoísmo, de total desrespeito ao próximo, também não terão sua hora de serem transformadas em rochedo que chora?
Os gestos, as condutas e as ações das pessoas num determinado instante não acabam ou são esquecidos nesse mesmo momento. Ora, o tempo tem o cuidado de guardar tudo no seu baú e ir buscar o que deseja no momento que as pessoas menos esperam. Se fizeram isto ou aquilo, com certeza que o espelho das ações reluzirá novamente. E não precisa esperar o julgamento bíblico e o seu juízo final para que as pessoas paguem com a devida moeda pelo mal que fizeram. Não precisa esperar tanto, pois quem faz aqui por aqui mesmo começará a carregar consigo seu cada vez mais pesado quinhão de sofrimento.
Na mitologia, o desrespeito aos deuses era certeza de castigo; no nosso mundo, o desrespeito às regras de conduta e às leis do comportamento, quando não é castigado pela própria sociedade com o desprezo e a repulsa, sofrerá certamente a punição merecida no além. Ao menos é isso que se espera para aquele que não que ver o outro como igual, como irmão de destino e como pessoa que merece consideração e respeito. Indo de encontro a tais princípios, sobre si recairá não o castigo de se transformar em rochedo que chora, pois longe de ser um deus ou semideus, mas sim de ter de suportar o suplício do esquecimento, que merecidamente dói muito mais.
Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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