NO REINO DO REI MENINO – XXXII
Rangel Alves da Costa*
Naquele covil de serpentes estavam algumas das espécies mais peçonhentas e perigosas de todo o planeta, dentre as quais a coral-verdadeira, a cascavel, a surucucu-pico-de-jaca, a jararaca e a taipan australiana, que dizem ser a cobra mais venenosa do mundo. E no meio delas, atordoado e aos gritos de socorro o baixinho Otnejon.
Foi salvo pelos seus guardas no exato instante em que alguns desses répteis preparavam-se para dar o bote venenoso e mortal. Quer dizer, mortal para as pessoas normais, pois nenhum tipo de veneno era ofensivo ao organismo do baixinho. Dizem que foi um trabalho de "fechamento de corpo", feito por um velho curandeiro em troca dos seus sonhos. Não morria mais de veneno de cobra, mas também não podia mais sonhar, só ter pesadelos.
Quando foi retirado às pressas de junto de suas amigas insaciáveis, Otnejon, todo envergonhado por ter sido encontrado naquela situação vexatória e não poder compreender como aquilo tinha acontecido, já que tinha certeza que não havia mais ninguém ali, no mesmo instante resolveu arrumar um culpado. Assim, pegou a cobra mais próxima e fez com que ela picasse o pescoço do mais jovem dos guardas que vieram lhe socorrer. Morreu sufocado em cerca de cinco minutos, tendo o seu corpo jogado para o festim das venenosas.
Precisava descobrir urgentemente onde os objetos estavam e assim que se dirigia ao local do interrogatório do casal, foi surpreendido por um serviçal que lhe acenava num dos vãos do castelo. "Meu bondoso rei, queira me perdoar mas um dos guardas que ficam nas guaritas veio me pedir para lhe informar que fora dos muros há um pedinte, um desses mendigos que vossa majestade abomina, mas que é muito diferente dos outros, tendo algo com ele que o bondoso senhor precisa mandar investigar. Segundo o guarda, o moço estranho nunca foi visto por essas bandas, além do que não é maluco nem esse miserável todo, pois parece que sabe muito bem o que quer e não é só esmola não, ao que parece. Assim ouvi, assim repassei para o mais justo dos reis, com as vossas desculpas", foi o recado repassado pelo criado, cheio de nervosismos e salamaleques.
O mendigo referido pelo serviçal não era outro senão o espião enviado pelo rei Gustavo de Oninem. Estava ali tentando cumprir seu papel, investigando, buscando informações, fazendo as coisas conforme o combinado. A bem dizer, já havia colhido algumas informações importantes, restando apenas obter outras mais consistentes, bem como tentar se avistar com o segundo homem mais influente daquele reino. Já sabia quem era e onde poderia encontrá-lo, faltando apenas arrumar um motivo ou uma oportunidade para avistá-lo e gravar suas feições. O pequeno rei teria que ser bem informado, saber tudinho e tim-tim-tim por tim-tim-tim.
O enviado de Gustavo estava por ali andando de um lado para o outro, todo maltrapilho e desengonçado quando foi surpreendido por dois guardas, que chegaram por trás e, sem falar uma palavra sequer, foram praticamente arrastando o rapaz castelo adentro. Logo numa das salas da entrada foi empurrado em direção ao mal-afamado Otnejon, que já estava lhe aguardando. E sem demoras, mirando friamente o outro nos olhos, começou a falar:
- Não vou perguntar pela segunda vez: a serviço de quem você está espionando o meu reino, o meu castelo e a minha vida de bondade e amor aos otnejonenses? Diga rapaz, sob pena de receber um tratamento especial de umas feras famintas que eu crio e conheço bem. Diga rapaz... – Falava e indagava gritando com extremada fúria.
Contudo, mesmo que já temendo o pior, o rapaz calado estava e calado ficou. Seria fiel ao seu pequeno rei até o fim. E vendo que este não estava mesmo disposto a colaborar, o baixinho foi se acalmando, acalmando, até que começou a falar novamente, agora com menos rispidez:
- Você deve ser um homem de grande valor para o seu rei, já que prefere morrer para não dizer o nome dele nem o que lhe interessa do meu reino e da minha humilde e caridosa pessoa. Mas sei quem é esse maldito, esse safado que já me desafiou com uma resposta indecente que me mandou. Logo logo ele terá o que merece, pois vou arrasar totalmente aquele reino, esmagar um por um e dar uma mamadeira com veneno pra esse tal de menino rei. Desgraçado que ainda ousa me desafiar, e logo a quem, ao grande poderoso Otnejon de Edravoc, o mais destemido e sanguinário. Contudo, corajoso rapaz, vou fazer com você uma coisa que não gostaria de fazer de jeito nenhum, que é poupar sua vida. É isso mesmo, você sairá daqui vivo, vivinho da silva. Porém com a condição de fazer chegar a esse tal de menino rei o meu último recado, e junto com um pequeno presente, que é pra ele não dizer que sou mal educado. Aguarde um pouco.
Chamou um dos guardas, cochichou-lhe ao ouvido e depois voltou para onde estava. Tomou alguns goles de uma garrafa que estava num armário próximo e ficou zanzando de um lado para o outro, como se estivesse esperando alguma coisa. Com efeito, não demorou muito e o guarda entrou trazendo um pequeno embrulho na mão. Ao recebê-lo, o baixinho se dirigiu até o emissário e levantando a mão com o embrulho, disse:
- Eis o presente para o seu rei menino, menino e chorão depois que receber isso aqui – balançava o braço de um lado para o outro – E sabe o que é este lindo presente? Veja, vou lhe mostrar – e abriu o embrulho – Isso aqui é uma porção dos cabelos da mãe dele, a prisioneira Lize. Então, diga a ele que ou me entrega a coroa e outros bens que mandarei informar ou simplesmente sua mãe vai ficar sem o resto dos cabelos e também sem a cabeça. O seu pai também.
continua...
Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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