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sexta-feira, 6 de maio de 2016

ALQUIMIAS


*Rangel Alves da Costa


Os sábios falharam em eternizar a vida humana, transformar os metais em ouro e obter substâncias que curassem todos os males do corpo e da mente. O homem não se fez imortal nem o metal inferior foi transformado em ouro. Mas onde falharam os alquimistas, aqueles velhos bruxos, cientistas e sonhadores, que não conseguiram as fórmulas que superassem os ditames da divina criação?
Mesmo não tendo conseguido seus objetivos, a alquimia sempre foi reverenciada ao longo da História. Os seus objetivos estão insertos no próprio conceito. Tem-se a alquimia como a ciência mística que tem como objetivo principal a transmutação dos elementos da natureza. Daí que incansavelmente os alquimistas se empenharam para criar a Pedra Filosofal, que teria a capacidade de transformar qualquer metal em ouro, e o Elixir da Longa Vida, que daria a imortalidade a quem o bebesse.
Por trás da alquimia estão forças esotéricas, místicas e religiosas poderosas, sendo os alquimistas, por muito tempo, considerados como verdadeiros bruxos. Somente depois, após alcançar um caráter científico, é que sua concepção passou a envolver conhecimentos da astronomia, astrologia, química, metalurgia e filosofia. Nas artes e na literatura, alquimia passou a ter forte disseminação, vez que sua misteriosa prática serviu de pano de fundo para muitas e instigantes criações.
Até hoje se imagina a prática alquimista sendo realizada em porões escurecidos, com velhos e estranhos senhores ao redor de caldeirões, de fórmulas químicas misteriosas, de restos de animais e de árvores, como se estivessem preparando um enfeitiçamento ou uma porção mágica a mando de um rei. Mas não, apenas juntando, pela milésima vez, elementos para enfim chegar ao ouro e à imortalidade. Como dito, jamais conseguiram seus principais objetivos, mas de seus caldeirões, bacias e experimentos, surgiram conquistas até hoje validadas pela Ciência.
Diante da realidade de hoje, num mundo tomado de arrogâncias, violências, barbáries, roubalheiras, desesperanças, terrorismos, ameaças de todos os tipos, nada mais justo que se reinvente a alquimia e se vá buscar na transmudação das realidades cruéis e desumanas a possibilidade de uma existência melhor e mais digna. Não se objetiva a obtenção da Pedra Filosofal, do Cálice Sagrado (Santo Graal) nem do Elixir da Imortalidade, mas tão somente a fórmula de viver.
E qual seria a fórmula de viver, obtida através da moderna alquimia? Antes de tudo, a retomada no homem de seu estado de criação. Ao ser criado, como dádiva divina ao homem foi dado o poder de discernimento, de convivência responsável com os da mesma espécie e dos demais seres da criação, e o comando da vida sobre a terra, através de ações que dignificassem sua existência.
Uma fórmula que estabelecesse na mente humana a retomada de tais princípios, já seria uma alquimia essencial à vida e ao próprio homem. Ora, o homem não foi criado para o mal, para a guerra, para a injustiça nem para a tirania. A transmudação do estado natural para o estágio bestial foi invento do ser humano. O que se deseja apenas é que ele, no seu poder racional de ação, simplesmente compreenda que por sua culpa o mundo se transformou num lugar imprestável à vida. Seria demais mudar?
A mentalidade humanizada do homem redundaria em muitas outras alquimias. E nada impossível ou difícil demais de acontecer. Amar não é impossibilidade, conviver pacificamente não é algo inalcançável, as amizades e os cordiais relacionamentos não são situações irrealizáveis. Tudo tão fácil de ser visto e compreendido. Tanto o homem como a planta e o animal - e assim com todos os seres do planeta - nasceram com seus desígnios e razões de viver, e não parece justo que ocorram interferências para que o ciclo natural seja quebrado por atitudes irracionais.
Uma alquimia que faça renascer na mente humana seu lado bom, seu lado positivo, sua capacidade de fazer o bem e viver honestamente. Não é próprio de nenhum ser humano já nascer propenso à prática do mal, a ter condutas negativas, a se comportar e agir sempre contrariando a paz, a concórdia, o respeito. Duas gotinhas de vergonha na cara e mais umas tantas na mente maldosa e irracional.
E que o fogo queime no próprio fogo. Assim, uma alquimia fazendo com que o mal não alcance ninguém sem que antes o maldoso experimente de seu veneno. Uma porção tão eficaz que faça surgir um eterno espelho diante de cada um. E nele estará espelhado tudo o que foi desonrosamente praticado. Somente assim o homem teria de continuamente conviver com o olho do erro mirando-o a cada passo.
Uma alquimia diferente ou uma chance à vida. Como está comprovado que o homem não deu certo como ser da criação, então que ele seja testado até se transformar noutro ser. Um ser humanizado ou o lobo de si mesmo.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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