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sábado, 21 de maio de 2016

O NOME DO HOMEM


Rangel Alves da Costa*


Zé Caveira era o nome do homem. Ou ainda Faz-Defunto, Berro de Sangue e Alma Penada. Sob quaisquer desses nomes respondia Serônio dos Santos, seu nome de nascimento. Porém, muito mais conhecido como o maior jagunço que já pisou pelos sertões nordestinos. Jagunço, matador, um carnicento em pessoa.
Era o perigo em forma de gente, mas disfarçado de tal modo que ninguém dizia estar diante do maior assassino de toda a região do Mundaréu. Silencioso, com quase nenhuma palavra saindo na boca, esta só abria para encaixar o cigarro de palha e cuspir amarelado. Quem via cara não via coração, como se dizia por lá.
Protegido do Coronel Inacinho Quelemente, tinha carta branca para o cometimento de tantas atrocidades. Sua fama de matador, de perigoso demais e dono de um gatilho que não errava um tiro, não havia sido construída, contudo, sob as ordens do patrão, mas noutras lides de tocaias e emboscadas.
Começou sua vida de crueldades como pistoleiro de aluguel. Qualquer um que desejasse ver um desafeto estrebuchado e sem vida, era só fazer paga ao odiento sujeito. E por pouco. Qualquer quantia era valor suficiente para o acerto de morte. Mas rejeitava saco cheio de dinheiro e promessa de propriedade se o futuro defunto fosse padre. Deus me livre, padre dá um azar danado, dizia.
Mas acabou dando fim a um vigário. E por besteira. Um dia, depois de muito pensar sobre as tantas maldades praticadas, resolveu que o melhor a fazer era deixar aquela vida de matador. E imaginou que aquela sina tinha algo a ver com falta de batizado. Naquela idade e sem o sacramento do batismo. Sou um pecador, por isso que tanto puxo o gatilho, revelou a si mesmo. E se danou rumou a igreja.
Foi entrando e seguindo diretamente à sacristia. Quando viu pessoa tão mal afeiçoada e malamanhada no seu recinto de oração e bebericagem, o coitado do vigário quase que derruba uma garrafa de aguardente que tinha em mão. O que faz aqui? Foi a indagação feita. Ao que o homem respondeu: Vim me batizar, é só isso que quero.
Então o padre encheu o copo, virou uma relepada e ajuntou: Impossível. Nessa idade, sem padrinho, impossível. O senhor já passou do tempo de receber a água sagrada. Acho que o senhor não sabe nem rezar um Pai Nosso. O que sabe fazer mesmo na vida. E do cabra ouviu: Matar. E com isso aqui. E puxou uma arma para mostrar ao da igreja o seu instrumento de trabalho.
Foi uma morte terrível. Esbugalhando os olhos diante da arma, sem acreditar no que via, o vigário levou a mão ao peito e desabou. Morreu de ataque, caído ao chão, mas com o copo de cachaça seguro à mão. Sem saber o que fazer diante do inesperado episódio, o matador retirou o copo da mão, colocou mais cachaça, bebeu tudo de uma golada só, e saiu da igreja do mesmo jeito que entrou.
Já estava na estrada quando o sino começou a anunciar a partida do vigário. E seguindo foi em direção ao potentado do Coronel Tiburcino. Ao poderoso ofereceria seus préstimos de matador, ao menos em troca de comida e um chão para dormir. Mas não demorou muito por falta do que fazer. Já haviam se passado dois anos e somente cinco emboscadas de morte. Coisa pouca demais para um gatilho acostumado a muito mais.
Assim que soube que o ex-jagunço de Tiburcino estava na porteira em busca de emprego, o Coronel Inacinho nem pensou duas vezes. Mandou logo que entrasse, pois tinha uma encomenda urgente. Ofereceu dinheiro e proteção, e em seguida disse que precisava que desse cabo à vida daquele safado do Coronel Tiburcino. Mas ele nunca mandou matar o senhor, disse o contratado jagunço. Mas quero que mate ele, retrucou o nervoso coronel.
Deu um trabalho danado, pois tocaia que durou três dias e três noites, até que o coronel foi derrubado enquanto passava num alazão. Depois matou também o coronel seu patrão. E só porque lhe encomendou a morte do novo vigário do lugar. Não, esse não, pois esse vai me batizar. Foi o que disse antes de atirar.
E saiu tranquilamente esperando ser alvejado pelos outros jagunços. Mas que nada. Todo mundo tinha medo dele. E seguiu adiante sem olhar pra trás. Uns dizem que continuou matando, outros dizem que morreu de arrependimento. Ninguém realmente sabe que fim levou.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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