Rangel Alves da
Costa*
A
gravidez, seja em qualquer meio e situação, é sempre uma situação traumática e
que requer muitos cuidados. Surgem riscos, muitas vezes graves, tanto para a
mãe como para o bebê. Mesmo nas gestantes citadinas, com acompanhamento
pré-natal, não se descartam riscos de hipertensão arterial, de diabetes pelo aumento
da glicose no organismo, de estresse, além de problemas ginecológicos
regulares.
A medicina
moderna ainda não conseguiu afastar os riscos da gravidez nem possibilitar que
os filhos sempre nasçam saudáveis. Infelizmente, ainda há morte de parto e
vidas são perdidas ainda jovens por problemas durante o nascimento do bebê.
Hoje se tem evitado muito, mas as mulheres que não recebem tratamento e acompanhamento
durante a gravidez e o parto podem sofrer danos irreparáveis. E o que dizer
daquelas mulheres do cangaço?
A gravidez
de risco e as incertezas do parto foram graves problemas enfrentados na vida
cangaceira. Considerando o número de mulheres agregadas ao bando de Virgulino
Ferreira da Silva, o Lampião, muitos problemas surgiram na gravidez e parto das
cangaceiras, havendo conhecimento de morte. Ora, as parteiras geralmente eram
as próprias companheiras de bando, se esmerando em cuidados mas sem muita
experiência. Não havia panos limpos, medicamentos, cuidados básicos.
No
cangaço, a gravidez, dado o meio e às condições, era sempre de risco. Não se
imagine como conduta exemplar uma mulher grávida viver exposta às intempéries,
andando e correndo de canto a outro, numa situação de estresse e ansiedade
indescritíveis. Dia e noite desconfortáveis, alimentos inadequados, sem poder
contar com tempo suficiente para descanso. Certamente as pernas inchavam, havia
hemorragias, tensões de todos os tipos. E nem sempre as gestantes podiam se
afastar do bando para dar a luz em ambiente menos perigoso.
Por maior
cuidado que o companheiro tivesse, ainda assim não podia fugir do cotidiano
incerto e apressado do bando. A caminhada não podia sofrer atrasos pelo fato de
uma gestante não estar se se sentindo bem. Era a vida de todos que estava em
jogo. Daí o imenso sacrifício, dor e sofrimento daquelas buchadas que,
intimamente, não suportavam dar mais um passo sem um descanso. Mas tinham de
seguir adiante.
Seguir
adiante até não mais suportar. Não irrompia o grito, mas a feição apertada,
agonizante, já demonstrava haver chegado o instante do parto. E dor sobre dor,
pois também a certeza de que seu menino ou menino não poderia permanecer por
muito tempo ao seu lado. O cangaço não era lugar de criança, e por isso mesmo
os nascidos eram entregues a coiteiros e outros conhecidos do bando.
Os estudos
dão conta que após pouco tempo de bando, ao lado do seu Capitão, Maria Bonita
engravidou e acabou perdendo o bebê gestado. Sua filha Expedita somente viria
nascer em 1932, de parto normal (se assim é possível afirmar), debaixo de um pé
de umbuzeiro e depois entregue ao vaqueiro Severo Mamede para ser criada. Sila
engravidou pouco tempo depois de chegar ao bando, teve o filho, sendo Maria
Bonita a parteira, mas teve de entregá-lo para ser criado por outra família. Adília,
que também acompanhava a conterrânea, afirma que era choro de menino misturado
ao ribombo de tiros.
Pelos
relatos colhidos, a maioria dos meninos e meninas do cangaço - ou filhos de
cangaceiros - nasceram debaixo de pés de pau, de umbuzeiros principalmente.
Tinha-se como verdadeira dádiva que os nascidos não apresentassem problemas e
suas mães em pouco tempo pudessem retomar seus cotidianos. Mas algumas não
tiveram essa sorte, pois perderam suas vidas durante o parto. E de ao menos uma
a literatura cangaceira dá conta: Adelaide.
Adelaide,
nascida em Poço Redondo e primeira companheira de Criança (a outra foi Dulce),
morreu de parto. Mas não debaixo de umbuzeiro, mas dentro de uma rede enquanto
era transportada, já sem esperança de sobrevida ante seu estado agonizante,
para a povoação de Curituba, no sertão sergipano. E certamente consequência das
durezas da vida cangaceira.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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