SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sábado, 20 de novembro de 2010

OS OUTROS (Crônica)

OS OUTROS

Rangel Alves da Costa*


Talvez seja por uma questão de vaidade, egoísmo, soberba, desrespeito ou discriminação, mas diante de cada um geralmente o outro não vale nada. Não diz com a boca, mas o pensamento só falta acabar de vez com o próximo. Mas por quê?
Porque o outro vive sorrindo, demonstrando alegria e satisfação, e quando abre a janela ou a porta pela manhã agradece a vida e abre os braços para receber fluídos positivos. Bicho besta o outro diz!
Porque o outro vive feliz com a família, sai de mãos dadas com a esposa, brinca de bola com os meninos e leva todos a passear, faz do fim de semana uma festa e parece que tudo isso ainda é muito pouco. Cara antigo o outro diz!
Porque o outro deita na rede lendo jornais e revistas, senta na varanda para escrever, não vive sem um papel ou caneta na mão, leva pra casa livros e mais livros e dizem até que está escrevendo um romance. Esse além de besta é louco, o outro diz!
Porque viaja a trabalho, é convidado para participar de cursos e seminários, só vive pensando em estudar ainda mais para aumentar o conhecimento e crescer na profissão; não descansa enquanto não alcança o que deseja nem tem preguiça pra nada. Esse nem sabe viver, diz o outro!
Porque não gosta de estar como fofocas nem com vizinhos nem com conhecidos, não vive com aleivosias nem falando mal de ninguém, levantando suposições no intuito exclusivo de denegrir a imagem e a honra dos outros; nem quer saber da vida do próximo para que também não interfiram na sua. Mas êta cabra metido a besta por querer ser sério demais, o outro diz!
Porque ajuda quem bate à sua porta, dá esmola, compartilha um pedaço de pão ou um prato de comida, dá uma roupa usada e deixa até que menores abandonados sentem no banco do seu jardim e adultos pedintes passeiem por entre os canteiros, colham alguma flor e enchem os olhos de lágrimas. Esse quer ser bonzinho sem ser, diz o outro!
Porque abre a janela e fica com a face entristecida olhando o sol que se põe, sentindo melancolicamente a brisa da tarde, voando nos pensamentos quando a chuva cai de mansinho, surge a revoada e os seus passarinhos, a natureza dá sinais de beleza e mistérios, demonstrando ternura e meiguice, sofrimento e dor. Cara de molenga, é o que o outro diz!
Porque de vez em quando fala alto, grita, demonstra estar revoltado, enraivecido ou injuriado, e até chuta o muro, dá murro na parede e depois coloca as mãos na cabeça e começa a refletir sobre um monte de coisas. Agora enlouqueceu de vez, diz o outro!
Porque gosta de roupas simples nas simples ocasiões, se veste com extrema elegância em outros momentos, tem jeitos adequados para cada ocasião diferente, e até fala e sorri diferente dependendo de onde esteja e com que esteja. Só pode ter duas caras, o outro diz!
Porque vai com a família à missa aos domingos, gosta de ler a bíblia, possui salmos e passagens inteiras do livro sagrado na memória, e de vez enquanto discute questões religiosas com outras pessoas como se fosse verdadeiro teólogo. Também querer ser padre aí já é demais, diz o outro!
Porque sabe que a vida por mais longa que seja ainda é curta, e quem quer aproveitá-la na sua plenitude deve agir com retidão, ser honesto e viver como homem no pleno exercício da humanização, com a consciência de que cada um somente é perante a medida daquilo que faz. Só faltava querer se meter em filosofia, diz o outro!
Este sabe dizer obrigado, boa sorte, até! E o que terá a dizer o outro?




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

Um comentário:

Toninho disse...

Oi amigo, um belo exercicio sobre esta maxima dos olhos sobre o que o outro nos parece.A imagem é criada é caracteristica esta condição do ser em querer ser o analista das ações do semelhante,Gostei muito.Um abraço de paz e luz.