ZEZINHO NO MUNDO E O MUNDO DE ZEZINHO – 21
Rangel Alves da Costa*
Assim que Zezinho, nas miragens da réstia entre sol e sombra presentes no entremear da porta da igreja, avistou naquele vulto sua mãe e gritou que ela estava chegando, o povo ali presente olhou rapidamente para trás e, espantado e repleto de admiração, pôde confirmar o milagre que estava acontecendo: a mãe do menino salvador estava realmente adentrando na igreja!
Porém, quem havia ultrapassado a grande porta central da igreja não era Rosinha, a verdadeira mãe do menino, mas sim a imagem da Virgem Maria num andor, sendo trazida até ali nos ombros de quatro fiéis. Era sim, a mãe; mas a mãe de outro menino, o menino Jesus. Levando aquela imagem até ali, os fiéis procuravam unir a imagem da mãe à chegada do novo filho salvador, que era Zezinho.
E foi grande o desapontamento de Zezinho quando percebeu o seu erro, quando viu que havia confundido aquela réstia do andor com a imagem de sua mãe. Porém, diante da admiração e euforia do povo, não se deixou desanimar e aproveitou a situação para alimentar suas palavras. E assim continuou:
"Como vocês estão vendo, nada mais importante do que a imagem de uma mãe para que a gente fique cheio de encantamento e gratidão. Essa mãe teve o seu filho Jesus e minha mãe teve a mim. As duas eram pobres, os dois meninos nasceram e cresceram pobres. O filho desta se tornou nosso rei e rei do mundo, a quem devemos todo amor e toda bondade que existe na vida. O filho da outra, que sou eu, continuou sendo aquele pobre Zezinho que vive com imensa dificuldade para dar qualquer passo e o passo seguinte, e que rei só é dele mesmo, pois o seu reinado nos momentos atuais resume-se a qualquer pedaço de pão, a qualquer prato de comida, a qualquer mão estendida, a qualquer lua que sirva de lamparina no quarto de dormir, a todo sono no maior conforto do banco da praça, embaixo da marquise, ou em qualquer lugar onde eu possa fechar os olhos amedrontados e ainda assim poder sonhar...".
E neste momento a igreja já estava repleta, com pessoas eufóricas, gritando, chorando, querendo correr para se ajoelhar aos pés do menino que continuava falando:
"Como vocês estão vendo, sou um rei menino de reinado indestrutível na força que tenho para lutar e na certeza que irei vencer. E sairei vencedor de todas as dificuldades desta vida porque sei que até os pobres e humildes como eu têm direito à felicidade...".
Mas não teve mais como continuar falando porque a igreja se encheu de aplausos, de promessas nos olhos de cada um e com um belo canto na voz de todos:
"O povo de Deus no deserto andava
mas a sua frente alguém caminhava
O povo de Deus era rico de nada
só tinha esperança e o pó da estrada
Também sou teu povo Senhor
estou nessa estrada
Somente a Tua graça
me basta e mais nada
O povo de Deus também vacilava
as vezes custava a crer no amor
O povo de Deus chorando rezava
pedia perdão e recomeçava
Também sou Teu povo Senhor
estou nessa estrada
Perdoa se as vezes
não creio em mais nada
O povo de Deus também teve fome
e Tu me mandaste o pão lá do céu
O povo de Deus cantado deu graças
Provou Teu amor
Teu amor que não passa
Também sou povo Senhor
estou nessa estrada
Tu és alimento na longa jornada.
O povo de Deus ao longe avistou
a terra querida que o amor preparou
O povo de Deus corria e cantava
e nos seus louvores o poder proclamava
Também sou teu povo senhor
e estou nesta estrada
cada dia mais perto
da terra esperada".
E também:
"Glória, glória, aleluia, glória, glória, aleluia
Glória, glória, aleluia, louvemos ao Senhor.
Na beleza do que vemos, Deus nos fala ao coração,
Tudo canta, Deus é grande, Deus é bom e Deus é Pai.
É seu Filho Jesus Cristo, quem nos une pelo amor.
Louvemos ao Senhor.
Deus nos fez comunidade pra vivermos como irmãos,
Braços dados, todos juntos, caminhemos sem parar.
Jesus Cristo vai conosco, Ele é jovem como nós,
Louvemos ao Senhor.
Jesus Cristo é alegria, Jesus Cristo é Amor.
Da vitória sobre a morte deu a todos o penhor.
Venceremos as tristezas, venceremos o temor,
Louvemos ao Senhor".
A igreja se transformou então num grande palco de alegria e devoção, com lágrimas e hinos surgindo nas pessoas tomadas de emoção e felicidade. O padre Carmélio não acreditava no que via, mas sentia que um verdadeiro milagre já estava ocorrendo ali. E tudo por causa do menino Zezinho, do menino salvador.
Mas onde estava Zezinho, que ninguém conseguia vê-lo mais por ali?
continua...
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com
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