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A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



terça-feira, 23 de novembro de 2010

SOMOS RICOS DEMAIS (Crônica)

SOMOS RICOS DEMAIS

Rangel Alves da Costa*


Talvez não tenhamos agora mais que duas moedas no bolso, um monte de contas a pagar, ainda não foi feita a feira, e certamente faltará o gás e um monte de coisas que só faltam quando a gente está sem dinheiro.
No rosto, um ar de preocupação; em cima da mesa a falta do leite e do pão. Não é bom nem abrir a geladeira para não entristecer ainda mais. De repente, surge uma dorzinha de cabeça exatamente quando não tem mais remédio no armário. Já faz tempo que comprou uma calça nova, um chinelo ou uma camisa. Tudo ainda é novo porque de pouco uso, menos a certeza da volta por cima.
Para esquecer os problemas nada melhor do que procurar se distrair com os programas de televisão. E chegam as notícias dizendo que um milionário foi preso por sonegação de impostos, outro perdeu milhões em menos de meia hora na bolsa de valores; em qualquer lugar do mundo deram um rombo de bilhões e um banco faliu, outro banco teve lucro recorde de tantos por centos, e também foi o que mais aumentou suas taxas de juros. Dinheiro, dinheiro, dinheiro!...
Para que vale o dinheiro? Haverá de se perguntar, pois é inevitável a pergunta. Ao menos naquele instante em que falta tudo, não tem nenhum tostão e está endividado até dizer chega, ter muito dinheiro seria a coisa melhor do mundo. Seria mesmo?
É difícil compreender, mas ainda existem pessoas assim. Pessoas que estão com muitas dificuldades, mas ainda assim têm a certeza que o dinheiro não resolverá sozinho os problemas. E o que farão, então, para alimentar a esperança de dias melhores sem ter que fazer um empréstimo ou arranjar dinheiro de qualquer jeito?
Ora, compreendem a vida como o bem maior, sem nenhum valor que a possa usurpar, sem nenhuma fortuna que tire o seu significado, sem nenhum banco onde possa ser depositada. Compreender o significado da vida é por si só saber a inestimável fortuna depositada na mente, no espírito e no coração de cada um.
Basta dar a ela o que ela exige para ser afortunado sempre, que é dividir com o próximo o pouco que se tem; compartilhar com o outro os encantos da felicidade advinda dela própria; fazer da doação uma comunhão com Deus, porque somente este Homem sabe e pode agradecer em nome de todos.
Certamente o pote não secará nem a moringa se esvaziará se oferecer uma caneca de água àquele que tem sede. Quantas fortunas valem um cantil de água no deserto, quando não há mais oásis nem esperança. E quanto doce é água oferecida na sede e bebida com o coração!
Não há mais pão, mas ainda há biscoitos ou bolachão, e porque não oferecer um pedaço a teu irmão que mostra que tem fome? Muitos reis, soberanos e poderosos já deixaram apodrecer seus pães sem permitir que eles fossem doados aos famintos. De repente, os castelos, todos construídos com o fermento da maldade, começaram também a apodrecer. Ainda assim o pobre estenderá um pedaço de pão para o rei.
Se não há nada a oferecer que seja de beber, de comer, de vestir, certamente será possível encontrar coisas muito mais importantes para doar. Todos aqueles de bom coração têm uma palavra amiga, um gesto de conforto, uma atitude solidária, um apoio a abonar num momento de precisão. Certa vez uma criança só tinha o olhar e olhou de tal modo que todos compreenderam o significado do grito do dor. E bastou segurar na sua mão...
Por isso somos ricos demais. E de uma fortuna tão imensa que somente se iguala ao valor da bondade, do respeito a si mesmo e ao próximo, do amor verdadeiro, dessa joia inestimavelmente preciosa que se chama Deus!




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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