Rangel Alves da Costa*
Imagina-se que as estrelas estão sempre
distantes, muito distantes, lá no alto, no firmamento. À noite, no negrume do
céu aberto, então elas surgem brilhosas e apaixonantes. Ao lado da lua formam
um cenário noturno encantador.
Aqueles pontinhos luminosos lá em cima, e que
de repente parecem voar numa rapidez desenfreada, são como gotas perfumadas aos
poetas, amantes, apaixonados e tantos outros que procuram decifrar seus tantos
mistérios.
Mas o brilho das estrelas seria dádiva apenas
da noite ou seria possível avistar seu fulgor noutros instantes do dia? As
estrelas são avistadas somente no céu ou podem ser encontradas em outros firmamentos
da vida?
Surge então a ideia de céu estrelado como
possibilidade mental, de firmamento estrelado como desejo de cada um, de
luminosidade estelar em qualquer lugar que o sujeito deseje encontrar. Mas como
isso seria possível?
A melhor resposta está numa frase do filósofo
Aristóteles: “No fundo de um buraco ou de um poço, acontece descobrir-se as
estrelas”. O que isto significa? Simplesmente que a visão das estrelas é uma
possibilidade de qualquer um segundo o seu desejo.
Por outras palavras, significa que ao invés
de esperar o negrume da noite para que as estrelas surjam radiantes no espaço,
a pessoa pode antecipar sua visão e procurar encontrá-las em outros lugares. O
que importa não é a estrela em si, mas a visão dela que se deseja ter.
A frase de Aristóteles é permeada de metáfora
e simbologia. Logicamente que as estrelas enquanto astros celestiais não saem
do firmamento para surgirem noutro lugar, muito menos no fundo escuro de um
poço. Impossível de acontecer. Mas o sentido da frase é outro, bem diferente.
Quando o filósofo diz que no fundo de um
buraco ou de um poço, acontece descobrir-se as estrelas, está afirmando que
nada é impossível aos que se lançam ao desejo de encontrar. É a vontade, a
construção mental ou a idealização de algo, que acaba permitindo que o
inexplicável aconteça.
Acontece de descobrir-se estrelas num fundo
do poço ou a lua no fundo do mar, ou mesmo num copo d’água ou na lágrima que
cai, pelo fato de que a pessoa assim deseja encontrar. O desejo profundo, a
vontade enraizada, acaba permitindo céus, horizontes e noites, diante do olhar
ou em cima da cama.
Numa primeira análise, até se imaginaria que
Aristóteles tencionou afirmar, na mesma vertente de Shakespeare, que nada seja
impossível de acontecer, pois tudo entremeado de mistérios indecifráveis. A
leitura pode ser neste sentido mesmo, mas o que se depreende é a
intencionalidade maior em colocar a vontade humana como descobridora de
estrelas. E em lugares muito diferentes do céu estrelado.
As duas frases, a de Aristóteles e a de Shakespeare,
possuem a mesma conotação: “No fundo de um buraco ou de um poço, acontece
descobrir-se as estrelas” e “Há mais mistérios entre o céu e a terra do que
pode imaginar nossa vã filosofia”. Nas duas um mesmo fundamento: a
possibilidade de existência do que se imagina como impossível.
É tal possibilidade de existência do que se
imagina como impossível que coloca no homem a responsabilidade de romper as
barreiras do que se tem como inalcançável. O homem, contido pelo negrume,
aflito pela escuridão que o cerca, de repente sem saída para encontrar qualquer
luz, pode lançar sua última força para encontrar estrelas.
Ora, as estrelas de Aristóteles são os
desafios vencidos, os caminhos encontrados, a perseverança que venceu o medo de
não conquistar. As estrelas de Aristóteles estão apenas adormecidas em cada
indivíduo. Basta desejar que elas surjam e um céu iluminado será a recompensa
da fé, da luta, da obstinação.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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