Rangel Alves da
Costa*
É comum
ter o dia seguinte como símbolo de superação, de esperança, de reconquista.
Diz-se, então, que tudo amanhã será diferente, bem melhor, com novas e
positivas realidades. Igualmente com relação ao amanhecer majestoso depois da noite
de aflição e do dia ensolarado após momentos tempestuosos. Há sempre uma
analogia entre o que de melhor virá após o que foi tão difícil de suportar.
Tudo remetendo ao Eclesiastes: depois da escuridão vem a luz...
É, pois,
no dia seguinte, ou na sua expectativa promissora, que reside toda a esperança.
Ninguém deseja um amanhã sofrido, tormentoso, de verdadeira agonia. É comum na
maioria dos seres humanos o desejo de que novas conquistas sejam alcançadas dia
após dia. É a aspiração inata, ainda que a semeadura seja insuficiente para
prosperar em colheita. Mas é anseio humano sempre ter o melhor. Daí a ânsia de
felicidade ao abrir a janela do amanhecer, daí a expectativa de que tudo dê
certo, pois já manhã do dia seguinte.
Mas as
manhãs dos dias seguintes nem sempre acontecem. Ou deixaram de acontecer. Por
isso mesmo que é triste viver num Brasil assim, sem dia seguinte. E não há dia
seguinte porque tudo parece continuar na mesmice do caos, do absurdo, do
insuportável. Os jornais chegam com as mesmas manchetes, os noticiários
televisivos dão acréscimos às mesmas informações, as redes sociais e os sites
informativos sempre se voltam aos mesmos temas. Quer dizer, o Brasil parece
parado no tempo e ante um abismo medonho e sem saída.
Quando os
dias são difíceis, de crise e desalento, comumente se lança na esperança a
tábua de salvação. Surgem as palavras boas, os confortos e os alentos, e todos
na perspectiva de que amanhã será outro dia, de que a janela aberta ao
alvorecer mostrará uma face alvissareira, de que os caminhos adiante sejam bem
mais floridos e sombreados. O ser humano em si se apega nessa esperança
vindoura, nesse amanhã novo e promissor. Mas o que dizer do Brasil?
Longe dos
pessimismos, mas não há como deixar de reconhecer a estrada que terminou e não
se pode alcançar o outro lado por falta de ponte. Ao invés da ponte, da
passagem, o abismo diante dos pés. À frente, na outra margem, o tempo novo que
todos desejam alcançar, o amanhecer ensolarado por tantos tão sonhado. Como não
consegue voar, ao homem, desolado e triste, outra coisa não resta a fazer senão
procurar saídas dentro do próprio medo. Mas fazer o que, se todos se encontram
na mesma situação e ninguém ainda encontrou passagem?
Imagine-se
o Brasil como uma casa de portas e janelas fechadas, sem luz elétrica ou do
sol, relegado ao breu dos tempos. E dentro da casa pessoas tristes, sufocadas, temerosas,
avidamente buscando abrir os ferrolhos para encontrar saídas. Mas quanto mais
lutam mais os ferros emperram pela corrosão dos desgovernos, das improbidades,
das falcatruas, das ferrugens causadas pelos donos do poder, das leis e do
comando da nação. É como se o povo de dentro da casa se esforçasse para sair do
caos e do lado de fora outras forças agissem para a continuidade da caótica
situação.
As pessoas
desta casa não querem além de um pouco de luz, de ar puro para respirar, de paz
e tranquilidade. Tudo tão fácil não fosse as ferrugens que emperram o país e
aqueles que do lado de fora, ainda gozando da liberdade, insistem em não
permitir que o povo garanta o seu destino de brasileiro. E as dificuldades do
povo aumentam mais porque os escombros e os dejetos acumulados do lado de fora
também impedem a passagem do povo e a entrada da luz. Somente uma fresta na
telha quebrada permite imaginar que lá fora, no Brasil desejado, ainda há vida
para se viver.
Lamentável
que assim aconteça. Deveras muito triste que o Brasil de agora viva uma
situação assim, que seja um país sufocado, aprisionado, sem saída, sem portas
ou janelas que possam ser abertas na manhã seguinte. Certamente que o sol se
aproxima esplendoroso, que a luz quer iluminar sobre tudo, mas há uma névoa
escurecida, uma bruma espessa e enegrecida, que acaba impedindo toda luz e toda
prosperidade de novamente incidir sobre a vida.
Enquanto a
cerração não for dissipada e os culpados paguem por suas culpas, enquanto o
nevoeiro não for amainado e os desgovernos deixem de governar, somente serão
avistadas as portas e as janelas fechadas numa casa cujas pessoas desejam apenas
viver. Lá fora os cães ladram espantados com os que estão libertos e se arvoram
de donos das manhãs, do sol e da lua. Mas dentro da casa continuam reféns
aqueles que nada fizeram para que tamanha escuridão recaísse sobre o seu mundo.
É um preço injusto que se paga por terem confiado suas manhãs e seus dias
seguintes àqueles que estão lá fora.
Chegará o
dia - assim se espera - que as portas e as janelas serão reabertas. E a
esperança maior é de que o sofrimento redunde em lição. Que nunca mais as
chaves da casa sejam entregues a mãos erradas e que se aprenda o valor de se
ter manhãs e dias seguintes.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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