Rangel Alves da Costa*
Ao entardecer a vida se sublima, se
entorpece, faz do pensamento um voo e vai. Ao entardecer o sentimento aflora, o
coração reencontra sua feição amorosa, a mente busca uma asa qualquer e vai. Ao
entardecer o vento vem trazendo canção, o olhar avista outonos e primaveras, a
boca pede um cálice de vinho e o passo sobe na nuvem e vai. Ao entardecer
avista-se a revoada, o barco que retorna ao cais, as ondas que chegam nervosas,
as pedras que se molham afoitas e a gaivota que sai do ninho do sentimento e
vai. Ao entardecer tudo é poesia, um bilhete de amor, uma carta saudosa, uma
palavra não dita que se repete na voz e uma interrogação que estende seus
braços e vai. Ao entardecer os coqueirais balouçam sua solidão, as conchas da
areia contam seus últimos segredos, as águas avançam apagando passos e levando
consigo a flor dolorosa deixada ao desvão. E tudo sai do ser e vai. Vai em
busca de viver, de acontecer, de ser menos dor, ser menos tristeza, ser menos
agonia. Vai sonhar um sonho de realização, de possibilidade, de fuga. Lá em
cima um sol se pondo, lá no horizonte uma tela pintada com feição e olhar. E da
janela, diante a vida que se estende lá fora, apenas a solidão que grita e não
vai. Não vai embora porque precisa ser solidão de reencontro, de lembrança, de
saudade, de nostalgia. Até que o amor chame o ser à felicidade e ele vá.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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