Rangel Alves da Costa*
Nasci num sertão cheirando a terra e sobre a
terra todo tipo de cheiro e sabor. Cheiro de curral, de gado berrando, de palma
sendo pinicada, de bafo subindo depois dos pingos da chuvarada, de fruta madura
no pomar, de araçá e sapoti, de manga olorosa e goiaba bicada por passarinhos.
Um sertão tão rico e tão pobre, meu Deus. Hoje sei que muita gente vive na
miséria, passa fome e até sede, sobrevive no desalento e na desolação. Que povo
abandonado, meu Deus. Mas noutros tempos o sertanejo vivia muito diferente,
mesmo ostentando o indigno troféu da pobreza. Era um povo que amanhecia ralando
milho, catando ovos no quintal, avistando no varal a tripa de porco ou o pedaço
de toucinho, que batia café no pilão e depois acendia o fogão de lenha para a
gostosura da vida. O milho mais endurecido era passado no ralo para o cuscuz do
amanhecer. Ou da noite também. Não demorava muito e o pano do cuscuzeiro
começava a suar e no segundo depois pelos ares subia aquele cheiro gostoso e
inconfundível de sertão. O café torrado era colocado na chaleira e cinco
minutos depois aquele melado negro, oloroso, perfumado, se fazia de convite
para a xícara de experimentação. E também a banha de porco jogada na panela
para os ovos de capoeira misturados com toucinho. Uma verdadeira fartura e
festa para um povo e de tal regozijo. E engolia seu café da manhã como se
estivesse apreciando o sabor e o cheiro inconfundíveis do próprio chão. Um chão
tão sertanejo.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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