Rangel Alves da Costa*
A morte em si atormenta demais. Mas a morte
solitária é apavorante. O Velho Gercilino certamente que não poderá responder
como isso se dá. Morreu sozinho e na solidão foi pranteado. Por quem? Pelo
silêncio, pelo negrume da noite, pela ventania balançando a janela, pelo velho
cachorro que não deixou o pé do caixão. Caixão não, quatro tábuas retangulares
com uma embaixo como sustento. Morte pobre e solitária, desprezada, no
desalento de tudo. Foi encontrado caído ao pé do banquinho onde costumava
sentar ao entardecer. Morava sozinho, já idoso demais, e uma alma bondosa
cuidou de vesti-lo em trapos e estendê-lo naquele caixote raso de madeira. Não
se sabe onde tal caixão foi arranjado. Mas foi. Foi colocado por cima de
tamboretes no vão da frente do barraco e ali esquecido. Havia muitas casas e
pessoas pelos arredores, mas não se sabe o porquê do esquecimento daquela pobre
criatura nos seus instantes de despedida. Chegou o entardecer, entrou a noite,
a escuridão total. A ventania chegava, estremecia a porta, zunia lá dentro e
sumia. Pessoas passavam adiante, mas ninguém entrava naquela porta. Quando a
vida adormeceu e os arredores silenciaram também, o mesmo abandono continuou,
sem qualquer reza ou sentinela. Apenas a solidão da morte e uma vela acesa que
chamejava sem se importar com a ventania. Como a vela apareceu ali ninguém
sabe. Só se sabe que até hoje ela é avistada iluminando a solidão no casebre
ainda presente.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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