SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

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quarta-feira, 15 de julho de 2015

A FELICIDADE


Rangel Alves da Costa*


Plena de acerto a frase de Mário Glaab: Para muitas pessoas a felicidade é semelhante a uma bola: querem-na de todo jeito e, quando a possuem, dão-lhe um chute. Não menos verdadeira a sabedoria antiga: Ou se cultiva a felicidade ou ela não passará de sensação de ter alimentado o espírito por algum instante. Ou se preserva a felicidade ou ela faltará ao espírito todas as vezes que a adversidade ameace chegar. Ou se procura ser feliz plenamente ou o ânimo da alma não passará de grão infértil na terra árida.
Mas a felicidade é tão difícil de ser alcançada como de ser conceituada, pois surgida no íntimo e exteriorizada como ânimo de bem-aventurança. De qualquer modo, ela pressupõe o ânimo de feliz.  E tal estado comumente se caracteriza pelo contentamento, pela alegria, pela sensação de bem estar físico e mental. Diz-se, pois, que a pessoa está envolta de felicidade se apresenta tais aspectos. Mas não somente assim.
A verdadeira felicidade não se contenta apenas com um estado de ânimo ou uma sensação, pois exige que a percepção de estar bem, realizado, satisfeito, seja prolongada, de modo a provocar reflexos positivos nas atitudes. Assim, não é qualquer momento de satisfação ou instante de alegria que possa caracterizar como estado de felicidade. Daí que a tão conhecida felicidade passageira muitas vezes apenas ilude os sentimentos. E pode provocar danosas consequências.
Há até uma linha filosófica acerca da felicidade como uma das faces do ser no mundo. A outra face é a infelicidade. Como um raciocínio retirado do Eclesiastes, uma tem de acontecer para se dissipar e a outra surgir. Desse modo, a mera sensação de felicidade já traz consigo a certeza da infelicidade. Depois do sorriso a tristeza, depois do canto o silêncio, e assim num pêndulo que ora se mostra de um lado e no estando seguinte já pende de modo contrário.
Muita gente teme – e com razão – tal tipo de felicidade. Não são raras as pessoas que preferem permanecer num estado apenas de normalidade, sem se mostrar muito felizes nem muito tristes. É exatamente o medo da consequência do júbilo que as tornam reticentes, temerosas das demasiadas alegrias. Tudo fazem para fugir da confirmação do ditado popular: não há um bem que não traga um mal, não há uma alegria que não traga uma tristeza, não há nada que aconteça de uma forma para que mais tarde não aconteça diferente.
Com efeito, depois do dia vem a noite, depois da chuva vem o sol, e assim em diante, e com tudo na vida. Mas não é porque não se pode fugir do inevitável que a pessoa deve abdicar da busca da felicidade. E da felicidade maior que possa existir. Creio que somente a mais ampla felicidade, mesmo forçada a se tornar duradoura, possui o condão de submeter a infelicidade. Ou seja, somente o esforço pessoal para que a felicidade se mantenha acesa, vívida, radiante, conseguirá domar ou ir ofuscando a chegada de tempos mais entristecidos.
Ora, o ser humano não nasceu para a tristeza, para a lágrima, para a dor, para o sofrimento, ainda que de nada disso possa fugir. Ao inverso, é própria do ser humano a propensão ao prazer, à alegria, à felicidade. Tanto assim que faz de sua vida uma constante luta para sobreviver bem, para alcançar motivos de contentamento, para sentir-se realizado. E agindo assim não estará fazendo outra coisa senão em busca da felicidade, pois esta não é apenas o sorriso ou a alegria, o contentamento ou a alacridade espiritual, mas também a sensação de realização na vida.
Para muitos, a busca pela felicidade é tamanha, tão intensa e constante, que nem tem tempo de absorver as pequenas infelicidades que possam surgir. Até se espelha nos momentos difíceis para usufruir ao máximo seus instantes felizes. Quanto mais pensa e age assim vai transformando seu espírito em algo tão elevado que não será pouca precaução que o afastará do sorriso, da paz, da felicidade. Não se entrega, não se deixa abalar, faz do infortúnio apenas um ponto de partida, uma forma de recomeçar.
E seguindo vai. E certamente que o mundo, a vida e as pessoas sabem reconhecer quem vive desapartado do negativismo. Não há nada que lhe tire o ânimo, não há situação que não seja enfrentada com destemor, não há dificuldade que não seja enfrentada para logo ser vencida. Mas nada disso acontece porque o ser seja forte ou destemido, mas simplesmente porque não permite que nada de ruim se assente onde semeia seu contínuo grão de felicidade.
Semeia a felicidade grão a grão para que a colheita não seja grandiosa demais. Sabe que o comedimento, a paciência e a oportunidade, são os grandes segredos para o alcance dos grandes objetivos na vida. E por isso mesmo vai colhendo aos poucos suas razões de viver. O cuidado com a colheita e com o uso que dá ao que tem, de modo a não faltar quando mais precisar, permite-lhe viver com o coração sossegado e com a face pronta para sorrir quando bem desejar. Eis que é feliz, sabe cultivar e cativar a felicidade.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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