Rangel Alves da Costa*
Plena de acerto a frase de Mário Glaab: Para
muitas pessoas a felicidade é semelhante a uma bola: querem-na de todo jeito e,
quando a possuem, dão-lhe um chute. Não menos verdadeira a sabedoria antiga: Ou
se cultiva a felicidade ou ela não passará de sensação de ter alimentado o
espírito por algum instante. Ou se preserva a felicidade ou ela faltará ao
espírito todas as vezes que a adversidade ameace chegar. Ou se procura ser
feliz plenamente ou o ânimo da alma não passará de grão infértil na terra
árida.
Mas a felicidade é tão difícil de ser alcançada
como de ser conceituada, pois surgida no íntimo e exteriorizada como ânimo de
bem-aventurança. De qualquer modo, ela pressupõe o ânimo de feliz. E tal estado comumente se caracteriza pelo
contentamento, pela alegria, pela sensação de bem estar físico e mental.
Diz-se, pois, que a pessoa está envolta de felicidade se apresenta tais
aspectos. Mas não somente assim.
A verdadeira felicidade não se contenta
apenas com um estado de ânimo ou uma sensação, pois exige que a percepção de
estar bem, realizado, satisfeito, seja prolongada, de modo a provocar reflexos
positivos nas atitudes. Assim, não é qualquer momento de satisfação ou instante
de alegria que possa caracterizar como estado de felicidade. Daí que a tão
conhecida felicidade passageira muitas vezes apenas ilude os sentimentos. E
pode provocar danosas consequências.
Há até uma linha filosófica acerca da
felicidade como uma das faces do ser no mundo. A outra face é a infelicidade.
Como um raciocínio retirado do Eclesiastes, uma tem de acontecer para se
dissipar e a outra surgir. Desse modo, a mera sensação de felicidade já traz
consigo a certeza da infelicidade. Depois do sorriso a tristeza, depois do canto
o silêncio, e assim num pêndulo que ora se mostra de um lado e no estando
seguinte já pende de modo contrário.
Muita gente teme – e com razão – tal tipo de
felicidade. Não são raras as pessoas que preferem permanecer num estado apenas
de normalidade, sem se mostrar muito felizes nem muito tristes. É exatamente o
medo da consequência do júbilo que as tornam reticentes, temerosas das
demasiadas alegrias. Tudo fazem para fugir da confirmação do ditado popular:
não há um bem que não traga um mal, não há uma alegria que não traga uma
tristeza, não há nada que aconteça de uma forma para que mais tarde não
aconteça diferente.
Com efeito, depois do dia vem a noite, depois
da chuva vem o sol, e assim em diante, e com tudo na vida. Mas não é porque não
se pode fugir do inevitável que a pessoa deve abdicar da busca da felicidade. E
da felicidade maior que possa existir. Creio que somente a mais ampla
felicidade, mesmo forçada a se tornar duradoura, possui o condão de submeter a
infelicidade. Ou seja, somente o esforço pessoal para que a felicidade se
mantenha acesa, vívida, radiante, conseguirá domar ou ir ofuscando a chegada de
tempos mais entristecidos.
Ora, o ser humano não nasceu para a tristeza,
para a lágrima, para a dor, para o sofrimento, ainda que de nada disso possa
fugir. Ao inverso, é própria do ser humano a propensão ao prazer, à alegria, à
felicidade. Tanto assim que faz de sua vida uma constante luta para sobreviver
bem, para alcançar motivos de contentamento, para sentir-se realizado. E agindo
assim não estará fazendo outra coisa senão em busca da felicidade, pois esta
não é apenas o sorriso ou a alegria, o contentamento ou a alacridade
espiritual, mas também a sensação de realização na vida.
Para muitos, a busca pela felicidade é
tamanha, tão intensa e constante, que nem tem tempo de absorver as pequenas
infelicidades que possam surgir. Até se espelha nos momentos difíceis para
usufruir ao máximo seus instantes felizes. Quanto mais pensa e age assim vai
transformando seu espírito em algo tão elevado que não será pouca precaução que
o afastará do sorriso, da paz, da felicidade. Não se entrega, não se deixa
abalar, faz do infortúnio apenas um ponto de partida, uma forma de recomeçar.
E seguindo vai. E certamente que o mundo, a
vida e as pessoas sabem reconhecer quem vive desapartado do negativismo. Não há
nada que lhe tire o ânimo, não há situação que não seja enfrentada com
destemor, não há dificuldade que não seja enfrentada para logo ser vencida. Mas
nada disso acontece porque o ser seja forte ou destemido, mas simplesmente
porque não permite que nada de ruim se assente onde semeia seu contínuo grão de
felicidade.
Semeia a felicidade grão a grão para que a colheita
não seja grandiosa demais. Sabe que o comedimento, a paciência e a
oportunidade, são os grandes segredos para o alcance dos grandes objetivos na
vida. E por isso mesmo vai colhendo aos poucos suas razões de viver. O cuidado
com a colheita e com o uso que dá ao que tem, de modo a não faltar quando mais
precisar, permite-lhe viver com o coração sossegado e com a face pronta para
sorrir quando bem desejar. Eis que é feliz, sabe cultivar e cativar a
felicidade.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário