Rangel Alves da Costa*
A palavra, por mais realista que surja,
jamais traduz a imaginação, o pensamento, a ideia. E quando é escrita então. Na
escrita a palavra se esconde, se amedronta, fica querendo fugir. Mas há uma
explicação: quando se escreve não se tem a liberdade de expressar o que vem à
mente. Até que a pessoa se esforça, tudo faz para descrever exatamente aquilo
enraizado no pensamento, mas sempre sai um tantinho diferente. E principalmente
quando a escrita é literária, eis que já nasce direcionada. Então tudo
complica. O escritor quer dizer uma coisa, porém sua construção não permite que
seja assim. Tantas vezes lhe surge uma ideia tão bela que se desenvolvida
daquele modo seria de magistral criação, mas se vê impedido pela forma, pela
gramática, pela estética, pela suposição da aceitação ou não do leitor. Seja literária
ou não, a verdade é que a escrita já nasce capenga. Acaso nascesse pura seria
muito mais inteligível, vez que sentimento escrevendo emoção. Bastaria que o
escrevente, em primeiro lugar, não procurasse rebuscar o que lhe surgiu tão
singelo. Ora, se vai descrever um outono não precisa enveredar pelos idílios
das quatro estações, em termos comparativos e complexos. Uma flor é uma flor. E
por que se meter a descrever Versalhes? Não adianta. Se quero descrever uma
casinha de cipó e barro tenho que avistar o cipó e sentir o barro. Ou faço
assim ou sai diferente. Nunca me atrevo a inventar demais. Meu pensamento
conhece o que seja beijo, minha boca um dia já sentiu sua presença. E não posso
agora dizer sobre um ósculo relvado no lume.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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