Rangel Alves da Costa*
Belarmino mora distante. Nas lonjuras do
mundo, pois nas brenhas do mais matuto dos sertões mais matutos. Mora sozinho
num casinha de cipó e barro. Três vãos apenas: a entrada, a cozinha e o quarto
de dormir, mas quase tudo numa só parede caindo aos pedaços. Bebe água de
moringa, cozinha em panela de barro. Quando tem o de comer. Quando não tem
entra na mataria e vai catar fruta silvestre, raiz macia, uma rolinha ou um
preá. Não tem exigência, come qualquer coisa, mas gosta mesmo é de farinha seca
com rapadura. E também com um gole de café. Já não recorda o tempo que comprou
roupa nova, que calçou sapato ou usou lavanda. Depois que enviuvou perdeu o
gosto de quase tudo, menos do seu sertão. E é o sertão que não o faz desandar
de seu pedaço de chão. Gosto do zunido da mataria, do bicho afoito correndo de
canto a outro, do amanhecer e do anoitecer. De toda hora sertaneja. Enxerga a
vida através de sua televisão: a paisagem adiante, e apenas isso. Sabe quando
vai chover, sabe quando a seca vai chegar derrubando tudo, sabe quando vai
apenas serenar. Conhece o seu mundo. E vira profeta, sábio e filósofo após o
entardecer. Quando acende o candeeiro, a chama amarelada ilumina uma face plena
de sabedoria. Ali o retrato do conhecimento do mundo. Quando sai pra malhada e
senta no toco mirando a lua, então aquele clarão contorna as rugas de muitos
caminhos, muitas estradas, mapa da existência. E debaixo da lua só sai quando
ouve a cantiga tão esperada da ventania. Depois se ajoelha perante a luz do
candeeiro e reza uma prece pedindo para amanhecer. Apenas continuar vivendo é o
que quer.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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