SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quarta-feira, 7 de outubro de 2015

Palavra Solta: eu e a pedra


Rangel Alves da Costa*


Eu e a pedra temos muito mais afinidades do que nós mesmos possamos imaginar. Somos amigos, confidentes, lenço e ombro um do outro. Na verdade, às vezes nem sei se sou a pedra ou se ela sou eu. Também temos muitas características comuns: somos solitários, tristes, incompreendidos, sofridos demais. E também somos demasiadamente amorosos e sentimentais, ainda que imaginem sermos possuidores de corações verdadeiramente petrificados. A pedra possui o meu retrato e eu retrato a pedra. Gosto de distância, e a pedra também; gosto de ficar no meu cantinho sossegado, e a pedra também; gosto de estar debaixo do sol e da lua, e a pedra também; gosto de tomar banho debaixo da chuva, e a pedra também. Falo muito sozinho, e sei que a pedra também. Há um mistério para sermos assim tão parecidos. A pedra foi se formando grão a grão e eu também. Não nasci, fui sendo semeando ao sabor da brisa e ventania. A pedra encontrou um lugar e ali permaneceu, e eu em constante mudança para também encontrar meu destino de pedra. Ou de pó pelos ares. Mas antes disso ainda quero ter muitos momentos ao lado da grande amiga. Não há amizade mais fiel que a da pedra. A qualquer hora do dia chego e sou bem recebido. Ela me acolhe e pede para que derrame minhas angústias e sentimentos. Então eu falo e choro, alastro-me nos escondidos da alma. Ela escuta silenciosa e depois sempre me estende o seu colo para um repouso. No seu leito adormeço e acordo como se sua sábia palavra se entranhasse dentro de mim. Então me despeço e caminho fortalecido para os enfrentamentos da vida.


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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