Rangel Alves da Costa*
Depois que escolhe a sina não pode mudar o
destino. Lampião não forçava ninguém a lhe acompanhar, mas também não deixava
que o cabra desistisse da empreitada. Cangaceiro jurava fidelidade e por isso
mesmo aquela vida escolhida seria para o restante da existência. O que se temia
é que o cabra desapartado do bando acabasse fraquejando ou sendo forçado a
contar os segredos de mantença da sobrevivência cangaceira. E não havia nem
menos nem mais, pois tudo segundo a ordem do Capitão. Ora, deixar a vida
sertaneja e entrar num bando cangaceiro significa abdicar da paz e viver em
constante perigo. Não havia moradia, cama de dormir, banheiro nem mesa de
almoço ou jantar. A casa era a caatinga, a vereda, o pé de serra, o tufo de
mato, o coito, qualquer lugar no meio do mundo, debaixo da lua e do sol. Comida
era o que fosse encontrado. Carne de bode, de caça, fruta do mato, tudo descia
no bucho como iguaria requintada. Não havia longo repouso ou descanso, vez que
tudo na pressa da fuga ou do encalço das forças inimigas. O cabra estava deitado
com a cabeça por cima de pedra e de repente já tinha de estar posicionado com
arma na mão. Qualquer barulho na mata podia ser sinal do inimigo. Os olhos
tinham de avistar no meio da noite e os ouvidos discernirem entre bicho e
gente. E quando a bala cruzava os ares, então a resposta cuspia fogo. Atirando,
correndo, fugindo, avançando, gritando, silenciando, gemendo, sobrevivendo,
morrendo. E assim dia e noite. E todo dia assim, entre espinhos e sangrias, nos
carrascais sertanejos.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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