Rangel Alves da
Costa*
É costume
sertanejo anunciar as mortes e os sepultamentos através dos sinos das igrejas.
Desde os tempos mais antigos que os sinos dobrando ecoam funestamente,
principalmente nas horas mais inusitadas. E basta ouvi-los para que os corações
se aflijam e todo o ser se envolva em agonias e sofrimentos.
Também
desde os tempos mais antigos o que menos se deseja ouvir no meio da noite ou na
madrugada é o dobrar compassado e entristecido dos sinos. Não é nada alentador
ser despertado nas horas mais silenciosas e solitárias por aquele badalar
ecoando aflição. A pessoa logo acorda e fica imaginando o que teria acontecido.
Mas já conhece muito bem o significado daquele aviso.
Em
instantes assim, com os sinos ainda ecoando tristezas, a pessoa se vê
completamente tomada dos mais angustiantes pensamentos. Meu Deus, quem será que morreu? Eis a
primeira pergunta que surge na mente. Então, de modo confuso e temeroso, vai
fazendo do pensamento mil possibilidades para o acontecido.
Em
momentos assim, reencontra familiares, amigos, até pessoas desconhecidas. Fica
imaginando em que estaria doente, em que poderia ter sido chamado àquela hora,
em quem encontrou aquele momento como o da despedida terrena. Mas quem, quem
poderia ter falecido àquela hora? E muitas outras indagações vão atormentando e
afastando de vez qualquer resquício de sono.
Certa vez
ouvi dizer que os sinos dobram de maneira diferente segundo as exigências do
instante. Significa dizer que o badalar dos sinos anunciando uma morte não pode
ser o mesmo de um chamado à missa. E talvez seja por isso que os sinos do meio
da noite ou madrugada ecoam num compasso que mais parecem gemidos.
Noutra
feita ouvi igualmente dizer que se a pessoa prestar cuidadosamente atenção ao
aviso dos sinos poderá até sentir que o nome do falecido vai sendo pronunciado
ao som de cada batida. Sempre cadenciado, solenemente triste, dobra uma vez e
esvoaça em direção aos sentimentos mais aflitivos. Chega às pessoas já levando
lenço e luto.
O badalar de
sinos no meio da noite não só faz despertar como transtornar a cidade inteira.
Não há chamado para ofícios religiosos na madrugada, não há anúncio bom que
seja feito em meio ao negrume. Só há um fato que faça o sino dobrar: a morte. E
que anúncio terrível, melancólico, pesaroso, de indescritível sofrimento. E
muito mais pela dúvida de quem tenha falecido.
Luzes são
acesas, portas e janelas são abertas, olhos e passos logo vão surgindo. Os
olhares aflitos se lançam de lado a outro procurando avistar os sinais do
acontecido. Não há do que duvidar acaso se aviste uma casa com aglomeração de
pessoas. Os ouvidos também se põem atentos e procuram ouvir os lamentos que
também já ecoam naquele momento.
Mas tudo
silencioso, tudo na normalidade das noites e das madrugadas. Mas os sinos
continuam dobrando seu canto de luto e pesar. Não demora muito e as
confirmações chegam com os gritos, os soluços, as palavras maldizendo o
destino, os amigos e familiares se transformando num rio de lágrimas e
sofrimentos. Já não se ouve mais o badalar dos sinos.
Relatam
que após anunciar a morte, os sinos das igrejas emudecem para também prantear a
partida. E muito mais se a pessoa falecida costumava frequentar a igreja e contentemente
a ela se dirigia ante o aviso da missa, da ladainha, da procissão. Já outros
afirmam que eles continuam badalando em silêncio. E muito mais altos, pois
enviam mensagens aos céus.
Não faz
muitos dias que ouvi sinos antes do alvorecer, ainda quase na madrugada. Eu
estava no sertão e logo fiquei sabendo das dores germinando na aridez. A manhã
ficou mais triste e a cidade mais empobrecida pela partida daquele instante.
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
2 comentários:
Ainda bem meu caro Poeta e Filósofo Rangel, que aqui em nosso povoado, não há sino na igreja; quem avisa é um carro de som, que vai logo dizendo o nome do cidadão a ser sepultado. O susto é rápido mas não nos deixa em dúvida: QUEM É; QUEM SERÁ?
Abraços,
Antonio Oliveira - Bela Vista - Serrinha.
Aqui os sinos da catedral tocam todos os dias, Às seis. São alegres sinos.
Os sinos dobram por vários motivos. Dobram por serem sinos.
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