SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sábado, 17 de outubro de 2015

Palavra Solta: recordações


Rangel Alves da Costa*


Recordo-me ainda do acordar na madrugada para seguir pela estrada de chão sertanejo. Não demorava muito e já estava na porteira da fazenda. Mais alguns passos e já estava cumprimentando o vaqueiro. Meninote, sempre acompanhado de meu pai, não encontrava coisa melhor a fazer. Minto. Nada comparável ao banho na chuva, à molhação debaixo das biqueiras, o escorregar pelas calçadas de cimento liso. Também nada comparável ao dia inteiro nas beiradas do riachinho colocando arapuca pra passarinho ou mesmo pulando os quintais alheios para catar as frutas maduras. Voltando à fazenda, não demorava muito e já estava no curral com caneca ou prato à mão. Tudo para aproveitar do leite quentinho saído do peito da vaca. O vaqueiro ia fazendo o trabalho de tirar o leite e eu estendendo a caneca por baixo. O leite caía quentinho, espumando, numa brancura de algodão e cheiro de capim sertanejo. Depois era só colocar um pouquinho de farinha, mexer com a colher e saborear aquele prazer da vida. Cada vaca tinha um nome: Bonita, Malhada, Namoradeira, Sertaneja, Mulata, Cabocla. Muitos nomes para muitas reses. Sim, meu pai era rico. Mas depois ficou como aquela descrição de Drummond no poema Confidência do Itabirano: Hoje só resta um retrato na parede. E como dói!


Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com

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