Rangel Alves da Costa*
O rio corre manso, lento, preguiçoso. Mas
passando sempre com seu maravilhoso caudal, com sua indescritível pujança. Ao
longe um beiradeiro joga uma tarrafa, outro barco menor parece sumir nas distâncias.
Não há mais porto, não há mais embarcação potente ali ancorando para trazer e
levar de tudo um pouco. As velhas senhoras não sentam mais nas calçadas altas
ao entardecer para mirar paisagem tão sublime. Não há mais vapor apitando ou
canoa de tolda arribando com sua leveza de encantar. A carranca não é mais
avistada na curva do rio nem o nego d’água dá batim das ribanceiras ou da pedra
grande. Apenas um rio, mas mesmo assim tão belo rio. Um rio em mim menino, um
leito dos tempos idos. Outro dia uma lágrima se misturou às águas e seguiu seu
curso. Talvez duas lágrimas provocasse uma enchente daquelas antigas, onde as
águas avançavam sobre as calçadas e os quintais brotavam inusitados arrozais.
Chore não, menino. O rio não é mais aquele de outrora, mas ainda desponta belo
e vai correndo seu destino azul esverdeado. E no seu espelho d’água ainda o
poema tantas vezes lido e jamais esquecido: Venho no passo de outras águas e me
misturo num só mistério como o homem se mistura à vida. No meu silêncio as vozes
dos peixes e encantamentos das águas, na minha veia o deslizar da embarcação
que se deita ao porto enquanto sigo adiante. E passo e novamente volto, noutras
águas que ainda são estas que agora seguem. E o homem em pé sobre a margem
lendo a poesia que ele mesmo não cuida de escrever para o amanhã. Pois ainda
passo, mas não sem até quando tenho esse passo...
Poeta e cronista
blograngel-sertao.blogspot.com
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