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segunda-feira, 9 de agosto de 2010

AMOR: EXCLAMAÇÃO E INTERROGAÇÃO (Crônica)

AMOR: EXCLAMAÇÃO E INTERROGAÇÃO

Rangel Alves da Costa*


Que o amor possui voz, feição, personalidade e comportamento próprio todo mundo sabe. O problema é saber se, depois do silêncio que também é próprio do amor, a voz exteriorizada está mais para a interrogação ou para a exclamação.
Ortograficamente, interrogação e exclamação são sinais de pontuação que indicam uma pergunta ou uma dúvida e para conferir uma expressão de surpresa, espanto ou admiração, cada um a seu tempo e até conjuntamente: Te amo!; Te amo?; Te amo?!
Contudo, no amor, que possui uma significação que vai além de meras expressões conceituais, a sua verdadeira expressividade muitas vezes está mais nos gestos do que nos sinais ortográficos de pontuação.
Como será pontuado o que sente aquele indivíduo que de repente se descobriu enamorado, encantado, apaixonado? O que surge como espanto e admiração ao coração, aos poucos, no cair dos tempos, vai sendo instigado pelo mesmo coração a dizer se aquilo tudo vale a pena existir.
De início, o amor, as coisas e os mistérios do amor, o que se mostra e o que se esconde sob esse véu encantador, sempre estará marcado pelo inebriamento, o fantasioso e o fantástico. Não há como não vê-lo e senti-lo senão como o extremo e maravilhoso.
Exclama-se a pretexto de qualquer nova alegria do coração e não há porque duvidar de nada. Ora, por enquanto tudo se confirma, tudo surge para cimentar esse desejo ardente de amar ainda mais e tudo se repete conclusivamente: o amor é maravilhoso!
E nessa festa dionisíaca, onde o vinho do encanto e do desejo se alastra e entorpece a pessoa apaixonada, o cambaleante ser ainda assim pede um pouco mais, quer mais um gole, quer uma nova taça perfumada de corpo e com sabor de lábio. Oh! Se houvesse eternidade no amor como a eternidade que se faz neste momento, não haveríamos jamais de chorar uma lágrima sequer!
As estações começam a trair os vinhedos, as chuvas começam a cair muito mais do que o inesperado, as tempestades surgem, os vendavais se mostram terríveis e as geadas transformam as folhas em pedras e depois as destrói, faz cair, sumir aos pés dos que passam. Já não há tanto vinho, os cântaros já não jorram mais como há instantes atrás, muitas vezes se pede e não se tem uma gota sequer.
O que houve, ó triste Baco, que dorme sonhando em ser feliz um dia? As pessoas já estão com sede e não há mais vinho, não há mais alegria, não há mais festa, todos se dispersam, todos entristecem, todos começam a reclamar e a desesperar, e vem a lágrima e vem a realidade.
Onde estará o amor, que tão lindamente refulgia sob o macio vinho? Onde estará o amor que até instantes atrás, com as asas do gole a mais, já queria voar para lugares desconhecidos e fazia planos ainda maiores para tomar o mundo? Onde estará o amor que começou a se esconder quando anunciaram que os cântaros estavam secando, as taças esvaziando e as pessoas entristecendo? Alguém viu o amor por aí?
Com os vinhedos vistosos e a colheita promissora, com as uvas sendo amassadas e os cântaros enchidos do suco etílico, com as taças cheias e os lábios sedentos, com a festa e a disposição para se tomar sempre mais uma taça, tudo é felicidade, tudo é magia e encantamento; tudo é perfeição e parece interminável prazer. Assim é o amor no seu mais perfeito instante de exclamação.
Quando as taças começam a ser viradas sobre lábios sedentos e não se derrama uma gota sequer, pois não se festejou com medida, com cuidado e com razão, eis a tristeza que toma conta dos amantes que começam a duvidar do que realmente sentem. Eis o momento da interrogação no amor, que sempre surge depois que as pessoas sentem que a festa acabou ou que nem tudo possui o sabor embriagador do vinho.
Porém, nem tudo acaba assim, depois que a interrogação encontra uma resposta e dá um ponto final, pois no amor sempre cabe reticências...




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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