SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



quinta-feira, 19 de agosto de 2010

POÇO REDONDO: ASPECTOS SOBRE O REFÚGIO DO SOL (Primeira viagem)

POÇO REDONDO: ASPECTOS SOBRE O REFÚGIO DO SOL (Primeira viagem)

Rangel Alves da Costa*


O maior município do estado de Sergipe talvez também seja o mais pobre, o mais esquecido pelas autoridades e organismos governamentais, o mais injustiçado no atendimento às reivindicações de sua população carente e também o mais relegado aos planos inferiores na sua história, geografia, economia e cultura. Isto pelo governante, pelo que não conhece sua realidade e não vive os seus dias.
Contudo – e isso digo com certeza e com conhecimento de causa -, é indubitavelmente o mais acolhedor e aquele que melhor caracteriza, dentre todos os municípios nordestinos, a verdadeira identidade sertaneja, mesmo que com as agruras advindas pelo desolamento causado pelas longas estiagens, pelo desemprego e pela pobreza feia e ossuda.
Olhar as vastidões poço-redondenses, com os seus descampados bonitos, clima semi-árido e a caatinga com sua típica vegetação: arbustos (catingueira, aroeira, angico, juazeiro etc.) com galhos retorcidos e raízes profundas e a presença de cactos (xiquexique, mandacaru, palma, facheiro etc.) e bromélias (gravatá, caroá), é ter a presença do paraíso, pois ali é a vida e a moldurada de tudo que se tem, mesmo que se olhe mais adiante e não se enxergue nem uma gota d'água no riacho de leito aberto ou no tanque esquecido até pelos bichos.
E os olhos e a boca do sertanejo, na presença dessa coisa contraditória entre beleza e sofrimento, mesmo sem conhecer um só verso, canta em aboios Fernando Pessoa: "O Tejo é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia, mas o Tejo não é mais belo que o rio que corre pela minha aldeia porque o Tejo não é o rio que corre pela minha aldeia. (...) Mas poucos sabem qual é o rio da minha aldeia e para onde ele vai e donde ele vem. E por isso porque pertence a menos gente, é mais livre e maior o rio da minha aldeia. Pelo Tejo vai-se para o mundo.
(...) Ninguém nunca pensou no que há para além do rio da minha aldeia. O rio da minha aldeia não faz pensar em nada. Quem está ao pé dele está só ao pé dele". O Tejo é a vastidão sertaneja, e a aldeia do sertanejo é o próprio sertão.
Parafraseando Pessoa, toda a beleza que possa existir além do sertão jamais será mais majestosa do que tudo que na aldeia sertaneja nasceu. E essa aldeia impregnada de aridez cativante é mais bela por uma razão muito simples: o sertanejo é tão misturado à terra, que não é pessoa, é chão do sertão. Sendo homem/terra, vê plantado em si a responsabilidade de afastar do lugar os desatinos do destino, buscando preservar de toda ameaça que há.
A depender de cada estação do ano, se mais ou menos chuvosa (ou até mesmo sem nenhuma chuva durante anos seguidos), a vegetação de Poço Redondo exibe paisagens bastante distintas. Numa há toda uma exuberância do verde que recobre toda a caatinga e enche de vida as plantas, galhos e folhagens. São as chuvas que chegaram em gotas verdes de esperança. Noutra o que se verifica adiante e em tudo é um mundo acinzentado, marrom e triste, com plantas nuas e galhos retorcidos e mortos. As chuvas não vieram. O sertanejo olha para a barra desesperado e começa a rezar. Se ninguém vê a barra é porque chuva não vem, e aí então começa o sertão do sofrimento e da desolação.
É nesse contexto geográfico que está situado Poço Redondo. Localiza-se exatamente na região sertaneja de Sergipe, situada na mesorregião do Sertão Sergipano e na microrregião do Sertão Sergipano do São Francisco Esta microrregião é formada, além de Poço Redondo, pelos municípios de Canindé de São Francisco, Feira Nova, Gararu, Gracho Cardoso, Monte Alegre de Sergipe, Nossa Senhora da Glória e Porto da Folha.
O município de Poço Redondo possui uma área de 1220,2 km², sendo 10 km na área urbana e o restante na zona rural. É nele que se encontra a nascente do rio Sergipe, lá pelas bandas da Serra da Guia. Situa-se a uma latitude 09º48'18" sul e a uma longitude 37º41'04" oeste, estando a uma altitude de 188 metros. Está localizado ainda na região noroeste do estado de Sergipe, limitando-se a nordeste com o estado de Alagoas, a sudoeste com o estado da Bahia, a sul e a leste com o município de Porto da Folha e a oeste e norte com Canindé do São Francisco. O acesso a partir de Aracaju é feito pelas rodovias pavimentadas BR-235, BR-101 e SE-206, perfazendo um total de 184 km. Sua população está estimada em cerca de 30.000 habitantes.
Apresenta infra-estrutura de serviços razoável, contando com 1 agência bancária do BANESE, 1 agência postal, postos de serviços telefônicos com acesso a DDD e DDI, empresas de transporte rodoviário interurbano e interestadual, estações repetidoras de televisão, hotel e energia elétrica distribuída pela Empresa Energética de Sergipe S.A. – ENERGIPE, com linha de transmissão de 13,8KV na zona rural.
A sede é abastecida de água captada do rio São Francisco, através de adutora e mantida pela Companhia de Saneamento de Sergipe – DESO. Algumas vilas e povoados utilizam água captadas de minadouros e poços artesianos, perfurados pela COHIDRO e DNOCS, e mantidos pela prefeitura. A rede de abastecimento atende a 3.444 estabelecimentos, sendo 3.237 residenciais, 115 comerciais e 92 do poder público. O esgotamento sanitário é efetuado através de fossas sépticas e comuns, e o lixo urbano coletado é transportado em caminhão e carroça e depositado a céu aberto.
As cidades que estão situadas ao redor ou próximas ao município de Poço Redondo são as seguintes: Canindé do São Francisco (SE), Monte Alegre (SE), Nossa Senhora da Glória (SE), Porto da Folha (SE), Pedro Alexandre (BA), Piranhas (AL), Pão de Açúcar (AL), São José da Tapera (AL) e Olho D'água do Casado (AL). Através da BR-235, na denominada Rota do Sertão que também corta o município, é feito o escoamento da produção e permite grande fluxo e veículos pesados, principalmente em direção aos municípios de Canindé do São Francisco, onde está localizada a Usina Hidrelétrica de Xingó, e Paulo Afonso, este último na Bahia.
Geograficamente, o município está inserido no polígono das secas, com um clima do tipo megatérmico semi-árido, temperatura média anual de 25,2°C, precipitação pluviométrica média no ano de 605,2mm e período chuvoso de março a julho. O relevo é representado por superfícies pediplanas e dissecadas, em formas de colinas e tabuleiros, com aprofundamento de drenagem de muito fraca a fraca. Está inserido na bacia hidrográfica do rio São Francisco. Constituem a drenagem principal, além do rio São Francisco, o rio Jacaré e o rio Marraquinho. Os solos são Planosol, Regosol Distrófico, Bruno não Cálcico e Litólico Eutróficos. A vegetação, com já citado anteriormente, é de capoeira (plantas rasteiras), caatinga, campos limpos (áreas sem mata, cobertas de gramíneas) e campos sujos (com árvores distribuídas espaçadamente).
Geologicamente, o seu contexto está representado predominantemente por litótipos dos domínios neoproterozóico e mesoproterozóico da Faixa de Dobramentos Sergipana. No extremo norte, ao longo do Rio São Francisco, ocorrem pequenas manchas de depósitos aluvionares. Na porção norte, afloram leucogranitos (Granitóides tipo Xingo), dioritos, granitos e monzonitos (Granitóides tipo Curralinho), ortognaisses graníticos (Granitóides tipo Garrote), e gabros, microgabros, diabásios, troctolitos e ultramafitos da Suíte Intrusiva Canindé. Na região central do município, predominam granitos e granodioritos tipo Glória, migmatitos, anfibolitos, paragnaissses e biotita-xistos do Complexo Migmatítico de Poço Redondo, biotita-granodioritos (tipo Propriá) e metabasaltos, metarritmitos, ultramafitos, metavulcanitos, mármores, quartzitos, metabasaltos, metatufos, e rochas calcossilicáticas do Complexo Canindé. Na porção sul, afloram predominantemente augen-granodioritos e quartzo-monzonitos gnáissicos do tipo Serra Negra, ao lado de filitos, metassiltitos, anfibolitos, xistos, metarriolitos, latitos, mármores, ultramafitos, metaconglomerados milonitizados e metabasitos do Complexo Marancó (dados da SEPLANTEC/SE).
No município de Poço Redondo pode-se distinguir dois domínios hidrogeológicos: Cristalino e Metasedimentos/Metavulcanitos (Figuras 3 e 4), o primeiro ocupando aproximadamente 80% do território municipal. Os Metasedimentos/Metavulcanitos e o Cristalino tem comportamento de “aqüíferofissural”. Como basicamente, não existe uma porosidade primária nesse tipo de rocha, a ocorrência da água subterrânea é condicionada por uma porosidade secundária, representada por fraturas e fendas, o que se traduz por reservatórios aleatórios, descontínuos e de pequena extensão. Dentro deste contexto, em geral, as vazões produzidas por poços são pequenas e a água, em função da falta de circulação, dos efeitos do clima semi-árido e do tipo de rocha, é, na maior parte das vezes, salinizada. Essas condições, definem um potencial hidrogeológico baixo para as rochas cristalinas sem, no entanto, diminuir sua importância como alternativa de abastecimento nos casos de pequenas comunidades ou como reserva estratégica, em períodos prolongados de estiagem (dados da SEPLANTEC/SE).
Historicamente o município de Poço Redondo teve suas terras ocupadas por grandes latifúndios que desmataram parte da vegetação nativa da região para a implantação de pastagens para o gado. Mais recentemente esse município foi palco de grandes pressões sociais que culminaram com a implementação de mais de 32 (trinta e dois) projetos de assentamentos rurais, que na sua fase de ocupação das terras também provocaram sérios problemas de exploração indevida dos recursos da caatinga. Pode-se destacar que o município é quase totalmente formado por assentamentos advindos parte do processo de reforma agrária incrementado pelo governo federal (Vieira, Lício Valério L.; Silveira, Gilberto N. da, 2009).
A partir do processo de reforma agrária no Estado de Sergipe vários assentamentos foram sendo implantados no município devido à concentração fundiária e a improdutividade das terras. As famílias beneficiadas com esta reforma agrária proviam dos municípios circunvizinhos e de outros estados a exemplo de Alagoas e Bahia. Atualmente encontram-se cerca de 25 projetos de assentamentos rurais, com cerca de 2000 famílias, também em cerca de 25 acampamentos. Tais dados correspondem ao ano de 2009, na perspectiva do INCRA.
Atualmente, as famílias rurais vêm sofrendo com a diminuição da produtividade da colheita do milho e feijão, decorrendo da degradação do solo, que vem influenciando o município de Poço Redondo a ser uma área susceptível a desertificação. Muitos agricultores não conseguem mais obter uma boa safra, a exemplo do que ocorre no povoado de Santa Rosa do Ermírio, onde se plantava milho e feijão, obtendo de 4 a 5 sacos por tarefa e hoje com esse processo intenso de degradação só conseguem no máximo 2 sacos, por conta do empobrecimento do solo (Vieira, Lício Valério L.; Silveira, Gilberto N. da, 2009).
Segundo o Ministério do Desenvolvimento Agrário – MDA, o período de plantio na mesorregião do Sertão Sergipano, incluindo-se no contexto o município de Poço Redondo, o período de plantio vai de 1º de abril a junho de cada ano. Segundo fonte da Embrapa (2007), as espécies de algodão cultivadas no município são dos gêneros Gossypium hirirsutum (algodoeiro mocó) e Gossypium. barbadense.
O algodão do tipo G. barbadense é comumente encontrado em pequenas propriedades, no fundo dos quintais e na beira das estradas e serve para confeccionar pavios de lamparina e para fazer limpeza de ferimentos ou retirar esmalte das unhas. Por sua vez, o G. barbadense, também conhecido como algodão mocó é uma variedade que se adapta bem ao semi-árido, por ter raízes profundas, ser resistente às secas, infensivo às pragas e produzir por um longo período e em grande quantidade por hectare (chega a produzir 1.200 kg).


continua...




Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

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