POÇO REDONDO: ASPECTOS SOBRE O REFÚGIO DO SOL (Quarta viagem)
Rangel Alves da Costa*
O município de Poço Redondo conta com alguns povoados historicamente mais desenvolvidos e outros de formação mais recente. Dentre os primeiros estão Santa Rosa do Ermírio, Sítios Novos, Bonsucesso, Curralinho, Cajueiro e Jacaré. Já dentre os mais recentes estão Queimadas, Patos, Areias, Alto de João Paulo, Queimada Grande, Pedras Grandes, Lagoas das Areias, Guia, Risada, Marroquinho, Lagoa Dantas, Barraca do Negro, Matuto, Brejinho, Santo Antonio, Cruz dos Homens, Projeto Jacaré-Curituba, Soares, Serrote do Meio, Bom Jardim, Pedrinhas, Exu, Lagoa do Canto e Barra da Onça, dentre muitos outros.
Há de observar-se que os novos núcleos de povoação foram surgindo nas circunvizinhanças das grandes e pequenas propriedades agrícolas e, mais recentemente, há cerca de quinze anos, com o surgimento de grande número de assentamentos do movimento dos trabalhadores rurais sem terra. As grandes propriedades que foram desapropriadas, a exemplo da Queimada Grande, Lagoa das Areias e Barra da Onça, permitiram o surgimento de muitos núcleos habitacionais que se transformaram em verdadeiras povoações.
O atual assentamento de Barra da Onça por muitos anos se constitui num dos maiores latifúndios de Poço Redondo. De propriedade de um senhor conhecido como Toinho Leite, um rico proprietário de terras das bandas de Ribeirópolis, em Sergipe, era apenas uma imensa vastidão de terras improdutivas em meio a pequenas propriedades e até bem próximo à residência de famílias que não tinham nenhum pedaço de terra para cultivar seus meios de sobrevivência. Era verdadeiramente uma situação vergonhosa, exigindo-se medidas governamentais para que as terras fossem desapropriadas em nome da reforma agrária que já tomava feição pelo país. Contudo, enquanto o latifundiário estava vivo nenhuma medida eficaz foi tomada, com a possibilidade de desapropriação surgindo somente com a luta dos movimentos sociais do campo e da igreja católica, através da Diocese de Propriá, que ergueram a bandeira de luta.
Incitados pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra – MST, trabalhadores do município e de regiões circunvizinhas invadiram a propriedade, forçando os organismos governamentais tomarem medidas para assegurar a posse da terra e garantir o trabalho de todos. Assim surgiu o, de forma pioneira e oficialmente, o primeiro projeto de assentamento do estado de Sergipe.
Criado em 1986, o local é hoje exemplo de que os assentamentos da reforma agrária podem produzir com qualidade e gerar renda para quem trabalha no campo. O assentamento de Barra da Onça abriga atualmente mais de 200 famílias de pequenos trabalhadores rurais. Cada família possui cerca de 33 hectares e, além de trabalhar direta ou indiretamente com a produção de leite, também planta milho e feijão. A produção de leite se tornou na mina de ouro para os pequeno produtores.
Para se ter uma ideia, em 2001 a produção de leite era de cerca de três mil litros por dia, e atualmente chega-se facilmente à marca de 12 mil litros entre os meses de março e julho. Todo o leite produzido vai para as fábricas de beneficiamento de leite, dentre as quais a Laticínios União. Criado a partir da iniciativa de 30 agricultores assentados e construído com recursos do Incra e do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), o Laticínio União é considerado um dos mais eficientes instrumentos de incentivo à produção e combate à miséria no semi-árido sergipano. Além de auxiliar na manutenção do preço do leite, gerar dezenas de empregos diretos e promover a elevação da renda das famílias associadas, a instalação dessas fábricas assegura o escoamento da produção e beneficia a economia regional, garantindo a venda do leite a preços mais justos para o pequeno produtor.
Outro fator importante que pode ser observado no assentamento Barra da Onça é a preocupação com a qualidade do rebanho, vez que a produtividade do leite também depende da qualidade do rebanho. Assim, Com o auxílio de técnicos do Departamento de Desenvolvimento Agropecuário de Sergipe (Deagro), os criadores de Barra da Onça tiveram contato com técnicas de melhoramento genético, como a inseminação artificial. Capacitados e com uma pequena estrutura para o acondicionamento do material genético, eles iniciaram um trabalho inédito em áreas de reforma agrária do estado. Os resultados não demoraram a surgir. Vacas mais sadias e com maior potencial produtivo fizeram com que a quantidade de leite produzido no assentamento desse um verdadeiro salto.
Por sua vez, o assentamento Queimada Grande, ao lado da rodovia BR-235, na Rota do Sertão, que dá aceso à sede municipal, está localizado onde antes era um latifúndio com o mesmo nome, de propriedade de José Ferreira neto, o Zé Ferreira, que sempre procurou demonstrar aos órgãos governamentais, como o INCRA, que a sua propriedade, ao invés do era constantemente alardeado perante os movimentos sociais e a igreja católica, era sim de alta produtividade, com muitas pastagens e rebanhos, além do plantio de diversas culturas. Tais aspectos geraram um intenso conflito entre o proprietário e os trabalhadores do MST, sendo estes acusados da prática de uma série de ameaças e mortes de animais com o objetivo de fazer com que o proprietário cedesse.
Cuidando dos conflitos agrários em Sergipe, o professor e sociólogo Eliano Sérgio ("Um Balanço da Luta pela Terra em Sergipe – 1985/2005") assim se refere aos episódios ocorridos na Queimada Grande, mas desta vez não para citar as práticas criminosas encetadas pelos integrantes do MST, mas sim para vitimizar seus agentes em nome da fragilidade e submissão do homem do campo:
"Queima de barracos aconteceu na fazenda Queimada Grande, em Canindé do São Francisco, onde jagunços contratados pelo latifundiário tocaram fogo nos barracos de 150 sem-terra que ocupavam a área. Os jornais semanários Ação Popular (edição de 31/10/99, com a manchete: “Polícia toca fogo em sem-terra”) e CINFORM (edição de 01/11/99, com a manchete: “Delegado é acusado de tocar fogo em barracos”) noticiaram que o delegado de polícia de Santo Amaro das Brotas mandou tocar fogo nos barracos do acampamento Campo Grande, naquele município, onde 60 famílias de sem-terra, mobilizados pela FETASE, estavam acampadas dentro de uma área desde o dia 01/10/99. As chamas chegaram a atingir, inclusive, um dos acampados". Onde está Canindé do São Francisco leia-se Poço Redondo.
Certamente que daqui há alguns anos todos os assentamentos que se espalham pelo município de Poço Redondo já estarão caracterizados como verdadeiros povoados. Em muitos deles, como de Queimada Grande, já há ruas pavimentadas, casas construídas em formação de ruas, água encanada, luz elétrica, centros de produção artesanal, pequenas fábricas, laticínios (Barra da Onça) e até mesmo um comércio florescente. Dou outro lado, os outros povoados já historicamente reconhecidos como tal procuram se firmar no destino do progresso, mesmo com as grandes dificuldades apresentadas.
Santa Rosa do Ermírio, distando cerca de 40km da sede do município, na direção da divisa com o estado da Bahia, no município de Pedro Alexandre (também conhecido como Serra Negra), é não somente o maior povoado do município, mas também de todo o estado de Sergipe. Tal fato é motivo de indescritível orgulho de seu seus moradores.
Fundada em 03 de março de 1959, Santa Rosa do Ermírio é atualmente, reitere-se dizer, o maior povoado do estado de Sergipe, com cerca de 10000 habitantes e próximo aos 5.000 eleitores. Tem a maior bacia leiteira do estado, com cerca de 80 mil litros de leite produzidos diariamente, quantidade muito grande para um lugar que constantemente vive castigado pelas estiagens sertanejas.
A economia de Santa Rosa do Ermírio é aquecida pelo petróleo branco, o "leite". Com uma área territorial equivalente a do município vizinho de Monte Alegre de Sergipe, esse povoado promissor conta também com bons solos, o que propicia cultivos diversificados quando as chuvas permitem e a localização de boas fazendas e pequenas propriedades com um rebanho bovino selecionado.
A emancipação política do povoado, com a consequente elevação do lugar à categoria de município, é indubitavelmente o maisor sonho de sua população. Tendo a lei que regulamenta a criação de novos municípios como maior arma (Art. 18 da Constituição Federal), os defensores da independência afirmam que o povoado atende todos os requisitos para aquisição de sua emancipação: consulta plebiscitária a toda a população do município desmembrado, estudos de viabilidade municipal e existência de lei estadual, além de um período próprio estabelecido em lei complementar Federal. Ademais, pregam que o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição do Estado de Sergipe já prevê, no seu art. 24, a criação do município. Diz a referida Constituição Estadual:
"Art. 24. Fica assegurada a criação do Município de Santa Rosa do Ermírio, após o cumprimento do que determina o art. 4º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, pelo desmembramento da área descrita no parágrafo único deste artigo, dando-se sua instalação após a eleição do Prefeito, do Vice-Prefeito e Vereadores, mas não antes de 1º de janeiro de 1991.
Parágrafo único. O Município de Santa Rosa do Ermírio fica desmembrado do Município de Poço Redondo, e passa a ter os seguintes limites: inicia no riacho Jacaré no limite com Canindé de São Francisco; riacho Jacaré até o riacho das Carnes na confluência do rio Jacaré; linha reta até o riacho Cururu no encontro com a rodovia SE-208; rodovia SE-208 até a estrada para Santa Rosa do Ermírio; estrada para Santa Rosa do Ermírio até antiga rodagem Nossa Senhora da Glória/Paulo Afonso; antiga rodagem Nossa Senhora da Glória/Paulo Afonso até o limite municipal com Porto da Folha; limite Município Porto da Folha, Monte Alegre de Sergipe, Estado da Bahia e Canindé de São Francisco até o ponto inicial".
Situação idêntica quanto ao sonho emancipatório vivem os moradores do povoado Sítios Novos, o segundo maior do município. O Ato das Disposições Transitórias da Constituição Estadual, no seu art. 23, preceitua que:
"Art. 23. Fica assegurada a criação do Município de Sítios Novos, após o cumprimento do que determina o art. 4º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, pelo desmembramento da área descrita no parágrafo único deste artigo, dando-se sua instalação após a eleição do Prefeito, do Vice-Prefeito e Vereadores, mas não antes de 1º de janeiro de 1991.
Parágrafo único. O Município de Sítios Novos fica desmembrado do Município de Poço Redondo e passa a ter os seguintes limites: inicia na antiga rodagem Nossa Senhora da Glória/Paulo Afonso no limite municipal com Porto da Folha; antiga rodagem Nossa Senhora da Glória/Paulo Afonso até a estrada municipal para Santa Rosa do Ermírio; estrada municipal para Santa Rosa do Ermírio até a SE-208; SE-208 até o riacho Cururu; riacho Cururu até o riacho Barra da Onça; riacho Barra da Onça até a estrada Barra da Onça/Curralinho; estrada Barra da Onça/Curralinho até o córrego Bela Vista; córrego Bela Vista ou Bezerro até o rio São Francisco no limite com o Estado de Alagoas; limite com o Estado de Alagoas e Município de Porto da Folha até o ponto inicial".
continua...
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com
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