JUSTIFICAR O AMOR
Rangel Alves da Costa*
Minha menina, por mais que eu tenha dito que te amo e amo, tenho certeza que o amor verdadeiro não é justificado nem por palavras bonitas de serem ouvidas nem por atos agradáveis que não provam absolutamente nada.
Assim, minha menina, meu amor, tudo o que sinto e direi agora jamais ouvirá de minha boca nem receberá gesto parecido através de qualquer presente, pois o que verdadeiramente sinto só pode ser justificado comigo mesmo, dentro de mim, através do que eu acredito que sinto.
Deixai, pois, meu amor, minha menina, que o que penso, acredito e considero em cada passo que dou e cada momento que vivo, seja a prova maior que eu tenho de dar a mim mesmo, sob pena de achar que amo e não amar o suficiente para provar o amor.
O mar eu te dei não me arrependi, porque o mar que te dei já era de teu olhar. Mas digo que hoje mesmo naveguei nos teus olhos procurando uma sereia linda, mas só encontrei o que queria encontrar, que era uma princesa à beira-mar, princesa de olhos da cor do mar. Não duvido, meu amor, que essa princesa hei de amar e sempre amar.
Ulisses viajou, singrou os oceanos, e Penélope se pôs a fielmente lhe esperar; Ulisses enfrentou seres fantásticos e forças destruidoras da natureza, e Penélope cuidando do seu filho e esperando o seu amor retornar; Ulisses subiu aos céus e desceu aos infernos, venceu gigantes e teve que se entregar a amantes, e Penélope rejeitando todos os pretendes que lhe desejavam a mão e o trono; Ulisses fez um esforço desumano para reencontrar seu caminho pelas águas e voltar; e Penélope tecendo e desfiando o véu da esperança, compassando o tempo para o amor retornar; Ulisses retornou e encontrou Penélope tão casta como a mais virtuosa das mulheres. Valeu a pena lutar, Ulisses, valeu a pena esperar, Penélope? Por que os semideuses conseguem e nós não conseguimos, deuses um do outro que somos?
As flores não são belas porque são belas; os jardins não são bonitos porque são bonitos e são jardins; a chuva não molha porque é a chuva; o sol não queima porque é o sol; o rio não corre porque é o rio; o mar não é tão distante porque é o mar; a manhã não desperta para a vida porque é manhã; a lua não enlouquece de paixão porque é a lua; o vento não sopra porque é o vento; o medo não grita porque é o medo; a lembrança não dói porque é saudade.
E por quê? Ora, meu amor, minha doce menina, as coisas só existem porque permitimos sua existência, porque dissemos que são assim e assim acreditamos. A flor é bela aos olhos de todos? A lua apaixona todo mundo? Se quisermos iremos ver as mesmas águas do rio correndo noutro lugar, o mar ficar a um passo e a manhã não amanhecer. Mas quem haveria, meu amor, de não dizer da tua beleza ou duvidar da beleza que vejo?
Um dia, minha doce menina, haverei de subir na montanha descalço, sem uma gota de água, sem roupa para aquecer do frio, sem alimento algum, sem relógio, sem nada. Subirei sem descansar e quando chegar ao ponto mais alto a primeira coisa que procurarei encontrar é quem fui procurar.
Dizem que Deus mora lá no alto da montanha, em cada planta, em cada pedra, em cada flor, de onde fica observando as vastidões que criou e os seres que permitiu existir. E é Deus que irei encontrar, e quando estiver em meio aos seus braços irei gritar bem alto para que somente Ele e você ouçam: Não duvido de Deus, não duvido de ti, porque não duvido de mim!
Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário