SAIA DO SOL E DA CHUVA, ENTRE...

A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sexta-feira, 27 de agosto de 2010

UMA TRISTEZA TÃO GRANDE... (Crônica)

UMA TRISTEZA TÃO GRANDE...

Rangel Alves da Costa*


Não tenho medo do escuro e nem temo a verdade da luz. Caminho pisando em espinhos, me protejo quando penso que vou caminhar pelas nuvens. É tudo realidade porque gosto de realidade, mas minto pra mim mesmo todas as vezes que reflito sobre minhas verdades. Finjo que não amo para não mostrar sofrimento; sofro para ser feliz para os outros, aos olhos de quem me faz sofrer.
Um dia uma ventania soprou e levou um vento para bem longe porque este se apaixonou por uma folha de outono. Deu sorte porque a ventania levou-o com folha e tudo. Nunca tive essa sorte de o sol me transformar em cinzas e nem a lua me transformar num louco. Os loucos não têm a consciência da paixão e nem as cinzas fazem ressuscitar o impossível. Quem dera enlouquecer de verdade!
Rasguei a folha de papel e joguei pelo ar porque quis, porque estava com raiva das palavras que queria escrever e não saíam. Às vezes é tão fácil e tão simples escrever sobre amor que as pessoas se apaixonam na primeira rima que encontram, na primeira estrofe de paixão e na última dizendo que o ser invadiu o corpo e foi morar no coração. Mas não sei mais escrever, não sei mais rimar, não sei mais amar. Sem amor não há motivo, não há palavra, não há alegria, não esperança, não há nada.
Rasguei a folha de papel porque quis. Nunca mais vou acender a vela das minhas noites, nem procurar o vinho escondido, nem ouvir Offenbach antes de pegar no lápis com mão trêmula. A música clássica me vem como navalha e sem querer já quero entregar os meus pulsos só porque lembro teu nome. E você merece tanto? Se no sangue que jorrasse coubesse um barco a vela já teria partido. Não no barco, mas na vela que velaria o meu corpo solitário.
Mas ainda não é tempo de partir assim, do jeito que você desejaria que eu partisse. Tenho duas moedas guardadas para comprar mais um pouco de vida. Sei que a vida vale muito mais, mas só tenho tostões e vou pedir assim mesmo um pedaço de viver. Deve ser bom viver com medo que o restinho de vida acabe logo. Quando já não tiver mais jeito, vou lá e tento comprar fiado alguns dias. Será o tempo suficiente para enriquecer e nunca mais morrer.
Mas vou morrer assim mesmo, e muito antes do que você imagina. Não por sua culpa, já que no seu pensamento sou muito mais importante sofrendo do que morrendo. Você mesmo diz que eu tenha mil anos de infelicidade. Mil anos de sofrimento dá para a gente aprender alguma coisa. Eu, por exemplo, nunca vou esquecer que nunca aprendi nada de nada. Se soubesse teria desinventado o amor.
Comprei um caderno novo, cheio de folhas branquinhas que é pra escrever um livro sobre você. O nome do livro vai ser bem bonito, coisa assim como Diário de um dia ou Medo seguido de fuga. Os dois nomes são bonitos, mas preferia mesmo E o vento levou... Scarlett O'Hara iria gostar, a Melanie também. Seria uma homenagem ao que o vento vem nos trazendo esses anos todos. E o vento levou porque se foi toda a felicidade depois que o vento cismou de trazer a infelicidade.
Quando eu terminar de escrever o livro e todo mundo disser que vai ser o maior sucesso, a primeira coisa que vou fazer é jogar ele na fogueira. Vou jogar ele na fogueira porque terei a certeza que queria escrever uma coisa e escrevi outra. Tinha prometido a mim mesmo que jamais utilizaria a palavra amor e nem diria que um dia te quis, que um dia te amei, que te amo ou coisa parecida.
Se o livro contém essas coisas então não fui eu que escrevi. E vou queimá-lo dentro do meu quarto mesmo, quando a noite chegar, que é para as chamas iluminar minha mesinha e eu escrever um poema que tenho vergonha dizer, mas não de escrever:

O amor enlouquece
e insano me reconheço
reconhecendo o amor
que em ti desconheço
esse é o preço da paixão
esse é o preço que mereço.





Poeta e cronista
e-mail: rangel_adv1@homail.com
blograngel-sertao.blogspot.com

Um comentário:

Toninho disse...

Estrqanha forma de vida, estranha forma de amar, bem interessante esta viagem pelas loucuras do amar. Sua cronica ficou muito boa Ranhel e o fechamento perfeito. eu rasgo o livro e jogo na fogueira para esta escrito o que eu nao queria, isto é otimo rapaz! Meu abraço de paz e luz.