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A morada é simples, é sertaneja, mas tem alimento para o espírito, amizade e afeto.



sexta-feira, 18 de junho de 2010

EVANGELHO SEGUNDO A SOLIDÃO – 19

EVANGELHO SEGUNDO A SOLIDÃO – 19

Rangel Alves da Costa*


Muitas dores, sofrimentos e solidão, tais termos ficaram povoando a mente de Lucas mesmo após de ter saído da igreja e deixado o Padre Josefo também pensativo quando disse que se tinha uma missão sobre a terra cumpriria tal desígnio exatamente para combater as dores, os sofrimentos e a solidão, e os combateria com as únicas armas que possuía, que eram a palavra, a coragem e a fé.
Prometeu ao sacerdote que voltaria mais vezes para conversarem. O próprio representante de Deus afirmou que aquele templo estava de portas sempre abertas para que ele pudesse tornar prática, visível, sua concepção de igreja viva, segundo a qual a igreja é povo, deve acolher o povo com seus problemas e procurar ajudar a encontrar soluções, mas não apenas com palavras de conforto, mas principalmente com ações práticas que visem combater as raízes dos problemas e fazer brotar o homem renascido na fé de que tudo é possível pela fé e pela persistência.
A concepção de igreja viva surgiu em Lucas ainda criança, quando um dia, desinteressadamente, perguntou ao seu pai porque a igreja da cidade só vivia de portas fechadas. E o seu pai, sem encontrar uma explicação melhor para dar, simplesmente respondeu que talvez fosse porque a igreja só se preocupa com ela mesma, só abre as portas quando tem missa, casamento e batizado e esquece de que as pessoas às vezes precisam dela para, ao menos, entrar, sentar ali e orar para que Deus ajude a resolver os problemas. Ficou pensando nisso e jamais esqueceu.
Ao longo dos anos, a partir da resposta do seu pai, foi fortalecendo sua ideia de igreja viva. Na sua mente, na igreja viva o pregador dos ensinamentos não é somente o padre, cabendo a cada um usar do púlpito para expressar seus pensamentos, dizer dos seus problemas, procurar discutir soluções com os outros; os ensinamentos não são somente aqueles pregados percorrendo os passos da bíblia, mas também pelos passos do homem com e suas experiências para viver e sobreviver; o que a igreja recebe de doação não pertence a ela, pois tudo será repartido dentre aqueles que comprovem necessidade, e cada um procurará fazer com que ela receba cada vez mais e maiores doações, pois somente assim poderá ajudar muito mais; esta igreja, de portas abertas sempre, será o lar para o desabrigado ou abandonado, será o banco da praça para quem queira conversar, será o palco para o que queira cantar, será o leito para o queira chorar. E tudo isso porque a igreja viva é o próprio Deus humanizado em cada um.
Nestes pensamentos instigantes, caminhando em direção à sua casa, nem percebia que já estava quase defronte dela e que ali, passeando de um lado para o outro, estavam os alunos que há instantes atrás havia se despedido na escola. Ao se deparar com estes, surpresa no olhar e alegria no coração.
- Mas o que estão fazendo por aqui? Ainda bem que não está chovendo mais. A esta hora vocês deveriam estar estudando ou ao menos lá na escola. Mas me diga, o que os trouxe até aqui? – Indagava um Lucas sorridente, cheio de vontade de abrir logo a porta para que entrassem.
Paulinho, um dos alunos que estavam ali falando ao mesmo tempo, disse quase num grito:
- Depois daquilo tudo que ocorreu na escola, e como não haveria mais o que fazer lá nessa manhã, já que não tinha professor pra ensinar, resolvemos lhe procurar para saber o que tinha dito a diretora que deixou ela uma arara, vermelha igual a um tomate e falando coisa com coisa. Fale pra gente professor, conte pra gente o que disse àquela jararaca pra ela ficar assim?
- Não disse nada demais – Respondeu Lucas ainda se juntando aos alunos -. Mas deixe eu abrir essa porta que é para vocês entrarem, se é que a casa vai pra vocês todos – E se encaminhou de chave na mão, estendendo em seguida a mão para que entrassem.
- Não professor, preferimos ficar aqui fora mesmo. É tão bom e bonito esse lugar onde mora que dá vontade até de sentar no chão pra ficar vendo a natureza. É bem juntinho da cidade, mas parece que estamos mesmo é numa fazenda – Disse um dos garotos. Em seguida falou uma menina:
- Como a casa estava fechada, chamamos mas ninguém apareceu. O senhor mora sozinho professor?
Ainda em pé diante da porta, meio sem jeito diante de tanta gente amigavelmente curiosa, respondeu:
- Não morava sozinho, mas vou passar um tempo sozinho nessa casa. Mas isso é uma história comprida que depois contarei a vocês – E olhando para cima, acrescentou – Até que seria bom se ficássemos aqui fora mesmo, mas o problema é que poderá voltar a chover a qualquer instante e temos de estar protegidos.
Foi quando um dos alunos tomou a frente dos outros e perguntou:
- Professor, já que mora sozinha, a gente poderia vim todos os dias aqui pra conversar com você?



continua...




Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
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