GESTOS QUE SÃO PALAVRAS
Rangel Alves da Costa*
Pequenos ou grandes gestos existem que são palavras ou gritos. Não precisa abrir a boca e dizer, não precisa sussurrar ao ouvido e falar, não precisa subir na montanha e gritar, não precisa do microfone em punho para berrar, bastando às vezes, e com a eficácia do dito e compreendido, que o gesto expresse sua força de sentimento e seja de validade reconhecida onde é utilizado.
Assim, a partir de um simples gesto - que nada mais é do que a forma do ser humano se expressar através das mãos e do corpo, a linguagem corporal para expressar significados, a manifestação de sentimentos por meio de expressões corporais que substituam a fala -, de um aceno, de um adeus, de um piscar de olhos, de balançar a cabeça, de um abraço, de um fechar de olhos, de um dedo apontado para cima ou virado para baixo, tudo passa a existir com a mesma força da linguagem verbal, da palavra dita.
O rei acena para o algoz que dá início ao ritual macabro; ainda o soberano estende a mão e vira o dedo polegar para baixo ordenando que o carrasco elimine o rebelde; no meio da platéia delirante, dizendo com as mãos que aplaudem que as ações do rei merecem reconhecimento, haverá um ou outro inconformado com as atitudes que estenderá o dedo médio, que é o maior dos dedos, e mostrará que as atitudes do rei devem ser abominadas. Um fofoqueiro observa tudo com olhar atento, porém pelo canto do olho, e acena para a guarda real e depois aponta para o agressor, que passa a mostrar uma feição de surpresa e de temor, como se estivesse se sentindo vítima. Tudo isso sem nenhuma palavra ou um grito, mas tudo sendo concretizado através dos gestos.
A mão fechada e o punho cortando o ar ou batendo na mesa dizem do ódio que surgiu; o dedo que gesticula como se fosse apertando um gatilho não vem de pessoa que tem boas intenções para com o outro; dizem que é muito feio levantar o braço e bater no meio deste com a mão do outro braço; botar a língua para fora e mostrá-la para outra pessoa se tem como atitude muito deseducada; fechar a mão verticalmente e bater em cima dela com a outra mão aberta é coisa muita safada para uma pessoa que se respeita fazer, assim pregam os mais velhos; com certeza é menos impactante do que erguer o dedo polegar com um sorriso nos lábios, o que nem se compara com o levantar o dedo indicador e balançá-lo com o rosto sisudo.
Por outro lado, certas ações e atitudes que chegam silenciosamente do corpo possuem o imenso poder de transformar em segundos todos os sentimentos existentes num ser. Alguém que chega de uma longa viagem ou vai partir e não sabe quando voltará e chama para junto de si a esposa ou o familiar, e num longo abraço chora as lágrimas dos que amam e sente refletir no coração todo o amor, não precisa dizer mais nada. Há coisa mais bela do que a menina na janela que vai acenando quando vê seu amor ao longe e num instante já está de braços abertos esperando que ele venha e a beije docemente nos lábios? Palavras não são nada perto disso.
Quando essa mesma menina, tristonha e com os olhos marejados, olha silenciosamente para o rapaz e de repente estende a mão e tira a aliança do dedo anelar e depois a devolve. Há palavra que resuma esse adeus gestual? E se esse rapaz não quiser aceitar a aliança e ela, numa atitude incontida, se joga nos braços dele e começa a abraçá-lo e beijá-lo? Mais tarde, quando o filho nascer, o máximo que ele poderá fazer é ficar sorridente e dando pulos pela clínica, pois a enfermeira já o olhou e colocou o dedo indicador entre os lábios. Silêncio!
Sou poeta, sou pobre, nem venha esfregando o dedo polegar no dedo indicador que não tenho nada para oferecer, a não ser a força no olhar ao mirar teus olhos, estender a mão até sua mão, apontar para cima onde brilha a lua e depois, depois deixemos que o corpo fale. E depois chega um momento que nenhum gesto pode substituir a palavra, e é quando vou dizer te amo.
Advogado e poeta
e-mail: rangel_adv1@hotmail.com
blograngel-sertao.blogspot.com
Nenhum comentário:
Postar um comentário